A CONDESSA VÃSPER Aluà sio Azevedo - Bibliotecadigital.puc ...
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passaram-lhe pelo espírito num turbilhão vertiginoso; e ele, sem idéia justa de<br />
tudo quanto tinha a gozar, via a projetada existência através de um nevoeiro<br />
espesso dentre o qual sobressaía sempre o vulto formoso da amante, esse<br />
perfeitamente nítido, a estender-lhe os braços nus. Paris, Londres, Madri,<br />
surgiam-lhe na mente, como vistas teatrais numa apoteose de seu amor.<br />
— Então? perguntou Ambrosina, afagando-lhe os cabelos; pensas ainda<br />
em morrer?<br />
— Não! respondeu Gabriel, acordando. Daqui mesmo vou tratar da<br />
nossa viagem...<br />
— Pois bem, vai. Mas lembra-te que toda a cautela é pouca! Entendo até<br />
que não precisamos fazer provisão de cousa alguma, a não ser de dinheiro...<br />
Isso, sim, é que é necessário levar bastante. Meu falecido pai dizia que o<br />
dinheiro é a guerra do homem civilizado.<br />
Gabriel fazia cálculos silenciosamente.<br />
É verdade! — sugeriu Ambrosina. E como embolsarás uma quantia maior<br />
sem a intervenção de teu padrasto?...<br />
— Isso é o menos! é só encher um cheque contra o banco e terei o<br />
dinheiro que quiser! Quanto será necessário?...<br />
— Sei cá! Em todo caso filho, antes de mais que de menos... Não por<br />
mim, mas por ti mesmo. Além disso, pelo fato de estar o dinheiro em teu<br />
poder, não quer dizer que o gastaremos todo...<br />
— Creio que, se eu levar vinte contos de réis, não precisaremos recorrer<br />
tão cedo ao Brasil...<br />
— Decerto. Isso nos dará para passar uma existência inteira!<br />
— Bem! rematou Gabriel, tomando o chapéu e despedindo-se da amante<br />
com um beijo. Estamos combinados! Vou tratar da viagem!<br />
Ambrosina, da janela, acompanhou-o com a vista por algum tempo;<br />
depois passou ao quarto imediato, onde encontrou Laura atirada sobre a cama,<br />
desfeita em pranto.<br />
Apoderou-se dela<br />
— Então! disse sorrindo. Que asneira é essa?... A menina escondeu o<br />
rosto, e chorou mais forte.<br />
A outra insistiu nas suas carícias. Tinha a voz meiga e suplicante, e<br />
afetava infantis pieguices.<br />
— Então meu benzinho? não queres responder à tua amiguinha? Vamos!<br />
fala!...<br />
— Tu te vais embora! balbuciou Laura entre soluços.<br />
Ambrosina beijava-lhe as lágrimas.<br />
— Tolinha! Sabes lá o que estou fazendo! Já não te disse que só a ti amo<br />
neste mundo?...<br />
— Mas vais-te embora!<br />
— E tu te sentirás muito com a minha ida?...<br />
A outra respondeu beijando-a repetidas vezes. Ambrosina pensou um<br />
instante, e disse depois com firmeza:<br />
— És tu capaz de fugir comigo?<br />
— Sou! respondeu Laura, olhando-a de frente.<br />
— Pois então, fica na certeza de que iremos juntas! Mas... (E fez sinal de<br />
silêncio) se deres a alguém uma palavra sobre este assunto, está tudo<br />
perdido!...<br />
Laura batia palmas de contente. Uma viagem misteriosa era todo o seu<br />
ideal. Não era aquele precisamente o rapto com que ela sonhava, mas em todo<br />
caso era um rapto.<br />
— Bom, disse Ambrosina. Temos ainda o que fazer para levarmos a<br />
efeito o nosso belo projeto... Dá-me papel e pena.<br />
Laura obedeceu.<br />
Ambrosina passou-se para uma mesinha ao canto do quarto. E aí<br />
sentada, na meditativa posição de quem se concentra numa complicada idéia,<br />
embebeu a pena na tinta, olhou atentamente para a brancura do papel e, afinal,<br />
escreveu o seguinte:<br />
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