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A CONDESSA VÉSPER Aluí sio Azevedo - Bibliotecadigital.puc ...

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— Ouve, meu filho! ouve-me por amor de Deus! exclamava o médico já<br />

na rua.<br />

Mas o outro havia de carreira alcançado o carro que o esperava na praça,<br />

e mandava ao acaso tocar para a frente a toda força.<br />

XL<br />

164<br />

A POBRE LAVADEIRA<br />

No dia seguinte, Gaspar, verificando que o enteado havia fugido do Rio<br />

de Janeiro, sem deixar rastos, sem a ninguém comunicar o destino que levava,<br />

meteu-se, ardendo em febre, a bordo do transatlântico em que contava seguir<br />

com ele para a Europa, e por sua vez desaparecia da Corte, levando o coração<br />

tão despedaçado, quanto é natural que a essas horas acontecesse igualmente<br />

com o pobre Gabriel.<br />

Semanas depois desse triste rompimento, que arrojava os dois amigos<br />

para longe um do outro, quase toda linfática população fluminense de novo se<br />

agitava num delírio de entusiasmo.<br />

É que na véspera Ambrosina estreara no Alcazar. Não se falava em outra<br />

cousa; os jornais vinham pejados de elogios à deslumbrante Condessa Vésper,<br />

meteram-se em circulação os mais pomposos adjetivos, para dar idéia dos<br />

encantos da debutante, e, nas rodas dos habitués do teatrinho francês e dos<br />

flanadores da rua do Ouvidor, descreviam-lhe com assombro a perfeição maravilhosa<br />

do corpo.<br />

Foi um estrondoso triunfo! Uma das folhas mais lidas, dizia nas suas<br />

publicações gerais, que a nova artista era uma glória nacional, e que os<br />

brasileiros se enchiam de orgulho ao lembrar-se de que aquele primor de<br />

estatuária viva era carioca da gema.<br />

Entretanto, a própria Ambrosina estava bem longe de esperar<br />

semelhante fortuna.<br />

Um dia o empresário do Alcazar, o Arnaud, que lhe havia já franqueado o<br />

teatro, apareceu-lhe de novo a falar mais insistentemente sobre isso, e, tão<br />

bonitos pintou os resultados da estréia, que conseguiu afinal abalar o espírito<br />

da loureira.<br />

Mas olhe que eu não sei cantar, homem de Deus!... objetou ela.<br />

— E alguma das que lá tenho o saberá porventura...<br />

— Mas terão boa voz, ao menos!...<br />

— Nom de Dieu! praguejou o empresário francês. Não se pode ter<br />

melhor voz do que a sua para o Alcazar!<br />

Ali não queremos voz, queremos jeito! percebe? A questão é de savoir<br />

faire!<br />

— Porém é que eu nunca representei em minha vida!...<br />

— E quem lhe pede que represente? Quero é que se mostre! Com esse<br />

corpo e essa cara não há que recear do público!<br />

Ambrosina sorriu.<br />

— Além disso... insistiu o Arnaud, o palco lhe realçará o prestígio. Não há<br />

para uma mulher bonita melhor moldura que os bastidores e as gambiarras!...<br />

— E a empresa, como vai?...<br />

— Vai mal! Pois se não tenho ninguém!... Aquela meia dúzia de gatas<br />

magrás que lá estão, desacreditam-me o teatro! Faltam-me boas pernas... Se<br />

a senhora me voltar o rosto, o Alcazar — morreu!<br />

E o Arnaud acompanhou a sua última frase com um gesto trágico de<br />

profeta; que prevê um fim de mundo.<br />

Ambrosina mostrou-se compungida.<br />

— Morre! é o que digo! A senhora não sei se o salvará, mas pelo menos<br />

há de suster-lhe a queda por algum tempo, até que apareça alguém capaz de<br />

arriscar ali um par de contos de réis!... oh! exclamou o empresário com ar<br />

convicto — aquele teatrinho é uma mina, que se pode explorar com muito<br />

pouco dinheiro! A questão é de reformar o jardim e mandar buscar um tenor!<br />

Não, não temos absolutamente vislumbre de um tenor! Quando lhe falei à<br />

primeira vez, há cousa de sete meses, se a senhora tivesse querido, eu podia<br />

164

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