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A CONDESSA VÉSPER Aluí sio Azevedo - Bibliotecadigital.puc ...

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que se tratava da filha do comendador Moscoso, porque ignorava semelhante<br />

circunstância...<br />

— E o que disse ele?<br />

— Ligou pouca importância às minhas palavras, e afiançou-me que tudo<br />

passaria dentro de uma semana.<br />

E passou?<br />

— Não. Cresceu!<br />

— Mesmo depois de saber quem é meu pai?...<br />

— Sim, minha senhora; mesmo depois disso...<br />

— Entretanto não seria mau esperar até ao fim da semana...<br />

— Para quê? para convencer-me de que sou o mais desgraçado dos<br />

homens?<br />

— Ou a mais impaciente das crianças....<br />

— Vê! V. Exa. zomba de mim, enquanto eu...<br />

— Vai dizer que sofre, e é exato; mas não por minha causa, sim pelos<br />

seus vinte anos, que estão purgando o idealismo absorvido durante todo o seu<br />

período acadêmico de S. Paulo.<br />

— Pensará então que eu...<br />

— Não me ama?... Valha-me Deus! não disse tal! Sei, ao contrário, que o<br />

senhor me adora; me adora com fogo, com entusiasmo, com paixão, com<br />

poesia! e é justamente por isso, é porque o seu amor é forte demais, que<br />

desconfio dele. O senhor não possui em si o combustível necessário para<br />

alimentar semelhante chama durante uma existência inteira... O seu coração<br />

não é nenhuma mina inesgotável de carvão de pedra!<br />

— Crimina-se então por amá-la demais?...<br />

— Certamente! O homem, qualquer que ele seja só pode dar de si uma<br />

certa e determinada dose de amor; nada mais pode dar por melhor que o<br />

deseje, porque mais não tem. A grande ciência da felicidade conjugal consiste<br />

em fazer com que essa dose chegue para a vida inteira. Ora, o senhor quer<br />

dar-me toda ela de uma só vez, e eu não a quero receber por essa forma. O<br />

que não quer dizer que não aceite; aceito-o, mas em pequenas prestações.<br />

Recebendo tudo de uma vez temo fazer como os perdulários — esbanjar a<br />

fortuna e ter depois de mendigar. Para que havemos de consumir em poucos<br />

dias aquilo que nos chega para sempre?... Além de que, meu caro, o abuso<br />

traz sempre consigo a saciedade, e o tédio, o enjôo; e eu, no fim de contas...<br />

— Aborrecia-se de mim...<br />

— Não digo isso, mas aborrecia-me de ser amada. E esta é a pior<br />

desgraça que pode suceder a uma mulher.<br />

— Mas então só me resta o recurso de fingir, indiferença, e amá-la em<br />

segredo, amá-la com todo o ardor da minha paixão!<br />

— Isso ainda seria pior: além da prodigalidade, haveria o completo<br />

desperdício. Seria como se alguém para não passar por pródigo, vivesse na<br />

miséria, mas fosse às escondidas atirando fora a sua riqueza. Não! não! nesse<br />

caso seria melhor sorvê-la de um trago, e dar depois um tiro nós ouvidos.<br />

— Por que se faz tão inocente e má?... Não vê que não pode haver termo<br />

de comparação entre o amor e o dinheiro? entre o coração e uma bolsa?... O<br />

dinheiro mede-se, conta-se, e o amor é indivisível. Como se pode conceber um<br />

registro para o coração?... O dinheiro tira-se do bolso quando se precisa e<br />

quanto se deseja; e o amor não! o amor sai por si, derrama-se, corre, como o<br />

sangue de uma ferida!<br />

— Ora! também não se pode parar o curso do tempo, nem lhe transpor<br />

as leis, e, no entanto, há quem o esperdice, e há quem o aproveite<br />

admiravelmente...<br />

— Não! o tempo não existe; a idéia dele é toda relativa; ao passo que o<br />

amor não tem relações, nem admite leis. É um fato real; existe! existe, que o<br />

sinto palpitar aqui dentro, não como um miserável relógio que nos mede vida<br />

gota a gota, mas louca e desnorteadamente, como neste instante! Eu te amo<br />

Ambrosina!<br />

E Gabriel segurou-lhe as mãos com ansiedade:<br />

71<br />

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