A CONDESSA VÃSPER Aluà sio Azevedo - Bibliotecadigital.puc ...
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mim poder evitá-lo... Não sei odiar de outro modo. Meu ódio só se pode esvair<br />
em sangue... Estou agora mais aliviada... parece-me ver correr do próprio<br />
peito a cólera vermelha e ardente, que dentro dele se tinha acumulado... Ai!<br />
quanto me desafronta o sangue que derramo! Sinto-me melhor... mais<br />
propensa à piedade... Vou compreendendo toda a razão das tuas palavras,<br />
meu bom companheiro... Cerraram-se-me os olhos, desfaleço, como se<br />
adormecesse no elevamento de um amor ideal... Já vejo assomar além, por<br />
entre as névoas que me ensombram, o vulto singelo e casto de teu pai... Ele<br />
sorri para mim... envolve-me toda no seu olhar compassivo e doce... Não me<br />
despertes...<br />
E a oriental deixou pender a cabeça, e desfaleceu. Gaspar correu aos<br />
aparelhos cirúrgicos e apressou-se a tomar-lhe a ferida. Mas a mão tremia-lhe,<br />
o coração saltava-lhe dentro com força, e as lágrimas corriam-lhe dos olhos<br />
em borbotão. Contudo, o médico operava, e Violante vivia.<br />
No dia seguinte, ela abriu os olhos e recuperou a fala.<br />
Suas primeiras palavras foram para pedir água. Gaspar negou-lha. A<br />
infeliz tinha a voz muito fraca, palidez mortal, e uma profunda melancolia<br />
espalhada por todo o semblante.<br />
Gaspar estava ajoelhado à cabeceira da cama em que a depusera. O<br />
outro médico já se tinha retirado.<br />
Os dois amantes ficaram longo tempo a se olharem com a mesma<br />
tristeza. Ela passou-lhe depois a mão pelos cabelos e chamou a cabeça dele<br />
para seu colo. Gaspar não podia articular uma palavra; as lágrimas corriam-lhe<br />
apressadas e quentes pela barba.<br />
— Como tu és bom, mem amigo! como tu merecias ser feliz...<br />
— Não estejas a falar, que isto te faz mal... observou Gaspar, no fim de<br />
alguns instantes. Vê se sossegas. Eu fico aqui, ao pé de ti...<br />
— Sim, sim; mas preciso muito que me faças um grande favor; manda<br />
chamar um padre. Eu quero casar-me contigo antes de morrer.<br />
— Tu não morrerás!...<br />
— Sim, mas manda chamá-lo...<br />
O padre veio e cumpriu-se a cerimônia. Depois Violante exigiu que se<br />
lavrasse um documento assinado por ela, declarando o modo pelo qual morria.<br />
Ficou tudo feito. Era ela a que parecia menos aflita.<br />
— Bem, disse quando viu que já não precisava dos estranhos, deixe-me<br />
agora com meu marido...<br />
Ficaram a sós os dois.<br />
— Vem cá, balbuciou ela, tomando as mãos de Gaspar, vem dar-me o<br />
teu primeiro beijo... Chega-te mais para mim!... Afaga-me! dize-me as<br />
ternuras que reservavas para a nossa noite de núpcias, fala-me do nosso<br />
pobre amor! Tu choras, meu amigo!... Então sempre é verdade que me<br />
amavas muito!... Sim! bem sei que era!... E teu amor foi sempre puro e<br />
consolador como uma boa ação. Não me repreendas; deixa-me conversar<br />
contigo!... Coloca teu braço debaixo da minha cabeça.... Assim! Mas a ferida<br />
começa a doer-me muito! Se me desse um pouco d’água! Tenho uma sede<br />
horrível! Ai quanto custa morrer!...<br />
— Não te aflijas, Violante! Não fales em morrer! Havemos ambos de<br />
gozar ainda do nosso amor em plena exuberância da vida!<br />
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