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A CONDESSA VÉSPER Aluí sio Azevedo - Bibliotecadigital.puc ...

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passado em um alcova junto à sua! que lutas tenho travado comigo mesmo,<br />

para manter o ar grave e as maneiras reservadas a que me condenam as<br />

circunstâncias desde que nos achamos a sós! Cheguei algumas vezes a odiá-la!<br />

parecia-me que a senhora zombava de mim; que me havia lesado nos meus<br />

direitos, e que a rispidez da sua conduta era um roubo feito à minha felicidade!<br />

— O senhor amava-me então?<br />

— Não! não era amor; apenas a desejava com todo o ardor do meu<br />

temperamento brasileiro. O que então me arrebatava não era o seu caráter<br />

nem as suas virtudes, mas sim a cor dos seus cabelos, a transparência da sua<br />

pele, o fogo dos seus olhos e a frescura do seu hálito. Não a amava, tanto que<br />

a desejava para minha amante. Depois que conheci, porém, todos os tesouros<br />

de bondade, que a senhora escondia sob as aparências de uma mulher<br />

leviana; depois que compreendi tudo quanto há de franqueza e lealdade nos<br />

seus sentimentos; quando descobri a sua abnegação, a sua coragem e a<br />

castidade de sua alma, amei-a, amei-a conscienciosamente, com entusiasmo e<br />

com honra! A senhora, se quiser, fará parte de minha família — eu serei seu<br />

marido!<br />

— Gaspar, disse Violante, segurando-lhe as mãos, eu te amo também;<br />

há muito! sempre! Amei-te primeiro na casta figura de teu pai, que foi o bom<br />

anjo da minha infância; amei-te nos teus folguedos de criança, nos teus<br />

progressos de estudante e nos teus estouvamentos de rapaz. Amei-te quando<br />

te vi estendido na rua, quando depois te vi ao meu lado, e amo-te agora com<br />

toda a segurança de minha dignidade. Todavia, tenho um juramento a<br />

cumprir... Eu só serei tua, esposa ou amante, amiga ou escrava, no dia em<br />

que Paulo Mostella cair debaixo deste punhal!<br />

E com os olhos incendiados de cólera, os lábios trêmulos, brandia o<br />

afiado estilete que ela trazia sempre consigo, desde que empreendera vingarse.<br />

— Mas eu não exijo tanto, contraveio Gaspar. Posso esquecer o passado.<br />

Tenho plena confiança em teu caráter e de nada mais preciso para fazer de<br />

minha legítima esposa.<br />

— Não se trata do que exijas tu, nem do que tu não queiras; trata-se<br />

unicamente daquilo que eu jurei ao meu próprio coração. Um homem ultrajoume.<br />

Eu tenho de vingar-me dele. Ou ele morrerá ou eu me matarei!<br />

Gaspar, mais tarde, empregou ainda todos os esforços para dissuadir<br />

Violante daquelas sinistras idéias de vingança, mas a oriental abanou a cabeça,<br />

com a calma de quem se sente firme na sua resolução, e disse, sorrindo<br />

tristemente para o companheiro:<br />

Cala-te, meu amigo! Tu ainda me não conheces... eu sou inabalável no<br />

meu ódio. é um temperamento de família; meu pai já era assim e ligou-se à<br />

minha mãe, porque encontrou nela a mesma rigidez de sentimentos. Nasci de<br />

duas tempestades, que me concentraram no coração todos os seus raios,<br />

todos os seus vendavais, todos os delírios do céu e do inferno. Meu pai morreu<br />

na guerra e minha mãe na miséria — foram igualmente fortes; um lutou contra<br />

a maldade dos homens e outro, contra a maldade de Deus. Deles eu só herdei<br />

além do caráter, este punhal. É um punhal de família, que passará, com a<br />

minha morte, às mãos de meu filho.<br />

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