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A Etica Protestante E o Espirit - Max Weber

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concepção do ódio entranhado com que a atitude contemplativa de Pascal<br />

sonegava apreço à ação no mundo, a qual, segundo a sua mais profunda<br />

convicção, só era explicável pela vaidade ou pela astúcia 62 — mas ainda mais<br />

distante da generosa e utilitária adaptação ao mundo promovida pelo<br />

probabilismo jesuíta.] Quanto porém a apresentar no detalhe a significação<br />

prática desse feito do protestantismo, geralmente isso vem mais como coisa<br />

sentida confusamente do que sabida claramente.<br />

Antes de tudo, é escusado lembrar que não tem cabimento atribuir a Lutero<br />

parentesco íntimo com o “espírito capitalista”, seja no sentido que até agora<br />

associamos a essa expressão ou de resto em qualquer outro sentido. Os próprios<br />

círculos eclesiásticos que hoje costumam com todo o zelo exaltar o “feito” da<br />

Reforma em geral não são nada amigos do capitalismo, seja lá em que sentido<br />

for. Mas com tanto mais razão o próprio Lutero com certeza teria rejeitado<br />

rispidamente qualquer parentesco com uma disposição mental como a que vem<br />

à luz em Franklin. Claro que não cabe aduzir aqui como sintoma suas queixas<br />

contra os grandes comerciantes, os Fugger 63 e que tais. Isso porque a luta contra<br />

os privilégios de fato ou de direito de algumas grandes companhias mercantis<br />

nos séculos XVI e XVII pode muito bem ser comparada à campanha hodierna<br />

contra os trustes, e esta não menos que aquela é, em si mesma, expressão de<br />

uma disposição tradicionalista. Contra estes, contra os lombardos, os<br />

“trapezitas”, os monopolistas, os grandes especuladores e os banqueiros<br />

favorecidos pelo anglicanismo, pelos reis e pelos parlamentos na Inglaterra e na<br />

França, puritanos e huguenotes moveram uma luta encarniçada. 64 Após a<br />

batalha de Dunbar (setembro de 1650), Cromwell escreveu ao Longo<br />

Parlamento: “Vamos abolir os abusos de todas as profissões, e havendo uma que<br />

a muitos faça pobres para tornar ricos uns poucos — ela não presta para a<br />

comunidade” — e dele já se podia dizer, por outro lado, que estava imbuído de<br />

um modo de pensar especificamente “capitalista”. 65 Em compensação, nas<br />

incontáveis declarações de Lutero contra a usura e a cobrança de juros em geral,<br />

se confrontadas com a escolástica tardia, emerge como francamente<br />

“retrógrada” (de um ponto de vista capitalista) sua representação da natureza do<br />

lucro capitalista. 66 Particularmente ele retoma aí o argumento da<br />

improdutividade do dinheiro já refutado, por exemplo, por Antonino de<br />

Florença. Mas nós não precisamos entrar em detalhes aqui, sobretudo porque a<br />

ideia de “vocação” em sentido religioso, nas suas consequências para a conduta<br />

de vida intramundana, era suscetível de configurações muito diversas. [O feito<br />

propriamente dito da Reforma consistiu simplesmente em ter já no primeiro

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