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verdadeiros conversos desejava assim — traço comum a todo pietismo em<br />
sentido específico — saborear já neste mundo, em ascese intensificada, a<br />
comunhão com Deus em sua bem-aventurança. Ora bem, esta última pretensão<br />
tinha íntimo parentesco com a unio mystica luterana e muitas vezes levava a um<br />
cultivo do lado sentimental da religião mais pronunciado do que na média do<br />
cristianismo reformado. É possível então apontar, até onde chega nosso ponto de<br />
vista, que essa era a marca decisiva do “pietismo” no campo calvinista. Pois o<br />
fator sentimento, originalmente estranho à piedade calvinista como um todo,<br />
porém intimamente aparentado com certas formas da religiosidade medieval,<br />
desviava a religiosidade prática para os trilhos do gozo da bem-aventurança<br />
eterna já neste mundo, em detrimento da luta ascética com vistas a ter certeza<br />
quanto ao futuro no Outro Mundo. E esse sentimento podia intensificar-se a tal<br />
ponto que a religiosidade assumia um caráter francamente histérico e produzia<br />
então, conforme mostram inúmeros exemplos, uma alternância de fundo<br />
psicológico [neuropático] entre estados semiconscientes de êxtase religioso e<br />
períodos de letargia nervosa ressentidos como “afastamento de Deus”, cujo efeito<br />
era exatamente o inverso daquela disciplina sóbria e rigorosa na qual a vida santa<br />
sistematizada do puritano capturava o indivíduo: um enfraquecimento daquelas<br />
“inibições” que escudavam a personalidade racional do calvinista contra os<br />
“afetos”. 115 Do mesmo modo, a ideia calvinista de danação da criatura, transposta<br />
em forma de sentimento — por exemplo, o chamado “Wurmgefühl”<br />
{“sentimento de ser um verme”} —, podia dar em esgotamento da energia na<br />
vida profissional. 116 E a ideia de predestinação podia, por sua vez, converter-se<br />
em fatalismo, quando — ao arrepio das genuínas tendências da religiosidade<br />
calvinista racional — se tornava um objeto de apropriação por estados de<br />
espírito e sentimentos. 117 E finalmente, a propensão a isolar os santos do mundo,<br />
se sofresse forte intensificação de cunho sentimental, podia levar à formação de<br />
uma espécie de comunidade conventual de caráter semicomunista, conforme<br />
demonstrado recorrentemente pelo pietismo, mesmo dentro da Igreja<br />
reformada. 118 Mas enquanto não se chegava a esse extremo provocado pelo<br />
cultivo do fator sentimento, vale dizer, enquanto os pietistas reformados ainda<br />
buscavam certificar-se de sua salvação no interior da vida profissional mundana,<br />
o efeito prático dos princípios pietistas resumia-se pura e simplesmente a um<br />
controle ascético ainda mais estrito da conduta de vida na profissão, com um<br />
embasamento religioso da moralidade profissional ainda mais firme do que o<br />
desenvolvido pela simples “honestidade” mundana dos cristãos calvinistas<br />
normais, que a “elite” pietista via como um cristianismo de segunda ordem. A