15.04.2013 Views

O Sacrifício - Unama

O Sacrifício - Unama

O Sacrifício - Unama

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

www.nead.unama.br<br />

perscrutador. Meiga e triste como sempre, tinha Virgínia agora os olhos postos em<br />

sua mãe. Esta compreendeu imediatamente o pensamento daquela. Era uma<br />

súplica que ela lhe fazia mudamente, mas do íntimo da alma. A tímida menina não<br />

se animava a repetir com os lábios as palavras de há pouco, que tinham suscitada à<br />

aflita mãe as acerbas expressões indicativas de sua grande pena.<br />

Mas Maurícia, contra o seu costume, teve bastante ânimo para lhe não deferir<br />

a súplica.<br />

— O que quer o Sr. Albuquerque é impossível, Virgínia — disse ela<br />

resolutamente. Se a tua felicidade depende de ajuntar-me novamente àquele de<br />

quem me separei, sentindo nas faces a impressão de uma ameaça e no coração os<br />

espinhos de inumeráveis afrontas, então serás infeliz, pobre filha, porque<br />

semelhante sacrifício é superior às minhas forças. Não me separei de teu pai por<br />

leviana, caprichosa ou desonesta; separei-me por ter conhecido que maior desgraça<br />

seria para mim e talvez para ele, continuarmos unidos do que separados. O muito<br />

que então padeci está constantemente a pôr-me diante dos olhos o muito que<br />

deverei padecer se tornar à sua companhia, na qual não tive uma impressão de<br />

verdadeiro prazer que resgatasse as humilhações, as contrariedades, os vexames,<br />

os desgostos que me causou, sem dar mostras do menor pesar, antes revelando<br />

que se comprazia em ver-me representar o papel de vítima. Tem paciência, minha<br />

filha. Deixaremos em poucos dias esta casa. Outra há de ter aberta para nós as<br />

suas portas. Não tenho vivido até hoje do meu trabalho? Ele não me há de faltar fora<br />

daqui. Tenhamos confiança em nós.<br />

Virgínia, como se acabasse de ouvir a sua sentença de morte, mostrou no<br />

rosto dobrada expressão de mágoa íntima. Levantou-se e pegou uma das mãos de<br />

sua mãe, que levou aos lábios por certo requinte de ternura.<br />

— E Paulo, mamãe? — interrogou com voz chorosa e comovida.<br />

Nesse momento, bateram à porta do quarto. Virgínia desdeu a volta da chave,<br />

e a luz da vela que ardia sobre a mesa a um dos ângulos do aposento esclareceu a<br />

face de um homem. Era Albuquerque.<br />

Maurícia foi ao seu encontro. Ele pegou-lhe da mão e conduziu-a para junto<br />

da mesa. Sentaram-se aí, tendo ambos nos rostos os tons sombrios do pesar que<br />

traziam no espírito. Foi Albuquerque o primeiro que falou.<br />

— Não quis deixar para amanhã o que eu devia dizer-lhe já.<br />

— Estimo muito saber que o senhor dá a devida importância a um<br />

acontecimento que parece destinado a influir diretamente na minha vida.<br />

— Que é isto, D. Maurícia? — interrogou o senhor de engenho com ares de<br />

quem estranhava o procedimento dela, que dera causa à sua visita. O que foi que tão<br />

inesperadamente a compeliu a praticar um ato contrário a todo o seu passado de há<br />

três anos? Todos notamos que a senhora, que sempre deu provas de ajuizada, se<br />

recusasse a aparecer a seu marido, cuja volta à minha casa fora assentada por mim<br />

no pressuposto de que lhe mereceria, quando não a satisfação do seu dever logo que<br />

eu chamasse para ele a sua atenção, a prática ao menos de uma delicadeza.<br />

— Neste ponto, o senhor tem razão, e eu peço-lhe desculpa, disse Maurícia.<br />

Fui descortês para o senhor, mas não podia deixar de ter semelhante descortesia<br />

quando o meu sossego exigia que destruísse imediatamente no espírito do meu<br />

marido qualquer esperança de reconciliação que ele alentasse. Eu devia ser cruel<br />

35

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!