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O Sacrifício - Unama

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www.nead.unama.br<br />

— Quem me disse? Ninguém, mas eu sei que há de ser assim. Eu sei que a<br />

senhora deixará hoje o engenho e me levará Virgínia. Não tenho forças para impedir<br />

esta separação; quem tem não a quer impedir; o que me resta pois?<br />

— O que lhe resta? Crer no futuro. trabalhar e esperar.<br />

— Então a senhora cuida que sem Virgínia eu poderia trabalhar e esperar?<br />

Eu não quero a vida sem Virgínia, não quero viver um momento sem ela.<br />

— Que está dizendo, Paulo? — interrogou Maurícia com sobressalto, que não<br />

pode disfarçar.<br />

— E porque não hei de viver muito tempo sem Virgínia, aqui lhe trago o que<br />

eu estava ajuntando para lhe dar no dia do meu casamento.<br />

Paulo tendo dito tais palavras, apresentou a Maurícia, para que a recebesse,<br />

uma caixinha preta sem entalhes e sem relevos.<br />

— Mas o que vem a ser isto?<br />

— Há de achar aqui o dinheiro que há três anos eu guardo. Ele pertence à<br />

Virgínia. Para que o quero, se ela me é arrebatada, e eu fico só e triste? Receba<br />

este penhor da minha infeliz afeição. Eu não quero nada para mim desde que perco<br />

Virgínia para sempre.<br />

— Para sempre! — exclamou banhada de lágrimas a inocente menina. Paulo,<br />

Paulo, não diga isto. Não repita estas palavras que não terei forças para as ouvir<br />

sem morrer.<br />

Paulo e Virgínia estavam abraçados, e as suas lágrimas pareciam-se com<br />

dias fontes que deviam não secar nunca mais.<br />

A luz risonha do sol que nesse momento penetrou no quarto, através dos<br />

vidros da janela, veio tirar o rapaz do longo e desalentado amplexo. Em baixo, já se<br />

ouviu a voz de Albuquerque. Os negros tinham partido para o serviço.<br />

Era tempo de deixar o aposento.<br />

Paulo pode separar-se de Virgínia, mas não pode ainda suster o pranto. Deu<br />

o andar para a porta, procurando encobrir o rosto aos olhos de Maurícia. esta<br />

chorava como ele, e tinha como ele, na alma a maior das angústias.<br />

Quando Paulo ia já a desaparecer, Maurícia percorreu com um olhar o âmbito<br />

do aposento. Virgínia estava caída com a cabeça entre as mãos sobre a cama, onde<br />

curtira durante a noite a sua imensa dor. Seus soluços abafados repercutiram no<br />

coração de Maurícia como os ecos de fúnebre surdina. Em presença desta cena<br />

angustiosa, ela — a comovida mãe — não pode senhorear o seu sentimento.<br />

Chamou Paulo.<br />

— Paulo, venha cá. Não se entristeça. A tristeza não quadra bem a vocês,<br />

meigas crianças. Sua felicidade triunfou. A vencida sou eu. O meu sossego, a minha<br />

liberdade, estes imensos bens da vida, este, sim, acabo de perdê-los neste momento.<br />

Sobre as suas ruínas levantam vocês o edifício de sua ventura, que Deus há de<br />

abençoar. Sustenham as lágrimas. Seja eu a única pessoa que nunca as tenha<br />

estanques senão na sepultura. Leve consigo as suas economias, e diga a seu pai que<br />

estou resolvida a reconciliar-me com o pai de Virgínia. Não posso mais resistir.<br />

Paulo e Virgínia, por impulso simultâneo, difícil de explicar-se, mas fácil de<br />

compreender-se, correram a abraçar aquela que tinha o poder de os fazer chorar e<br />

de os fazer sorrir como se fora uma divindade misteriosa e fatal.<br />

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