O Sacrifício - Unama
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www.nead.unama.br<br />
baixeza, nenhuma mulher se conservaria dentro dos limites da discrição. Abriu a<br />
porta arrebatadamente e correu para a cozinha. Que ia fazer? Ela mesma não podia<br />
saber. A verdade, porém, é que ela estava desvairada.<br />
Chegando ali encontrou Faustino.<br />
— Vosmecê vem ralhar comigo, sinhá Dona Maurícia, por eu estar brigando<br />
com Brígida? — perguntou o moleque tanto que reconheceu pelo semblante de<br />
Maurícia a cólera que lhe ia na alma.<br />
Maurícia nada disse. Não podia falar. Tinha a voz presa por oculta garra.<br />
— Vosmecê me perdoe — continuou o moleque em tom de humildade<br />
despeitosa. Eu queria muito bem a essa negra, mas ele me fez ontem uma só me<br />
deu a vontade de a matar. Vosmecê sabe que minha senhora prometeu que Brígida<br />
havia de casar comigo. Mas de que serviu esta promessa? A negra botou as<br />
mangas de fora, e tem andado solta como as bestas do engenho, Ontem de noite,<br />
quando eu cheguei do Recife, onde tinha ido de tarde, por mandado de meu senhor,<br />
não achei Brígida aqui. A porta do corredor, que vosmecê costuma fechar todas as<br />
noites, estava aberta, Há muitos dias que eu andava suspeitando uma coisa muito<br />
feira. Por isso, deixei-me ficar na sala. De uma vez, ouvi abrir a porta do gabinete e<br />
apontar um vulto branco; fugi para o corredor para esperar por ele, supondo que era<br />
Brígida; mas assim que fugi, o vulto foi outra vez meter-se no gabinete. Não pude<br />
ter-me e corri até lá a ver se dava com a negra; mas achei a porta trancada. Não<br />
pude sair da sala. Estive aí até amanhecer. Quando seu Bezerra abriu a porta da rua<br />
e saiu, eu, que estava detrás da porta do corredor, via negra tomar da sala para a<br />
cozinha. É por isso que eu estava ralhando com Brígida.<br />
— E onde está ela? — perguntou Maurícia<br />
— Fugiu com medo de mim para a casa-grande.<br />
Não havia que duvidar. Os indícios acabavam de ter a mais cabal confirmação.<br />
O torpe segredo estava já nos domínios da cozinha. Se houvesse encontrado a negra,<br />
Maurícia teria talvez praticado um desatino que não se compadecia com a sua índole<br />
e educação; mas, na ausência do objeto do seu ódio, do seu desprezo e da sua<br />
vingança, ela não pode suster o pranto. Nunca se vira tão aviltada aos seus olhos.<br />
— Vosmecê não chore, que aquela negra não há de voltar mais aqui — disse<br />
o moleque.<br />
— E que tem que ela volte ou não, se já aqui deixou a sua infâmia? —<br />
respondeu Maurícia. Não te entristeças, Faustino. Vou contar tudo a D. Carolina, a<br />
fim de ver se ela põe cobro à ousadia de Brígida.<br />
— Vosmecê pode contar à minha senhora o que se passou, mas eu nada<br />
tenho com isso, porque eu não quero mais saber de Brígida. Ela para mim está<br />
cortada.<br />
— Que está dizendo?<br />
— É o que digo a vosmecê. Deus me livre de casar com uma negra tão ruim.<br />
Não faltam negras boas no engenho de meu senhor. Eu para mim não a quero nem<br />
de graça.<br />
Maurícia encaminhou-se imediatamente para a casa-grande. Antecipando-se,<br />
Brígida inutilizara toda a obra que a infeliz senhora devera levantar, sobre<br />
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