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O Sacrifício - Unama

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www.nead.unama.br<br />

E a mestiça estendeu-se a fio comprido na areia.<br />

Paulo teve, então, ocasião de observar as formas que ele nem sequer<br />

imaginara nunca. A sua primeira impressão, vendo a rapariga correr para a banda<br />

dele, fora fugir, desaparecer; mas a novidade e o escândalo puderam mais que o<br />

escrúpulo do rapaz, posto que educado nas lições de sã moralidade.<br />

— Se não vier buscar-me, não voltarei tão cedo — prosseguiu a mestiça.<br />

— Deixa-te disso; vem. Se eu for lá, hei de trazer-te arrastada pelos cabelos.<br />

— Não vê! Os meus cabelos são as suas prisões. Sua mulher há de ter inveja<br />

deles. Não tem?<br />

— Vem, diabo! — tornou Bezerra contrariado.<br />

— Que é isto? Está com raiva porque falei na sua mulher? Bonito que você é!<br />

A sua mulher sou eu.<br />

— Pois sim, és tu mesma; mas o que eu quero é que saias daí.<br />

— Eu não. Está com ciúmes? Cuidarás que alguém, vendo-me nua, vai tirarme<br />

do seu poder?<br />

— Deixa-te de asneiras, e não me metas raiva.<br />

Dizendo estas palavras, Bezerra correu da água para a margem, onde a<br />

rapariga se espojava, ora encolhendo, ora estirando as pernas. Vinha resoluto a<br />

levá-la por força, mas quando entre ele e ela não se interpunham mais de dez<br />

passos, Janoca, por diabrura, encheu a mão de areia e atirou-lhe sobre a cara,<br />

acompanhando este movimento de cínica e estrepitosa risada. Bezerra deu um grito,<br />

sobresteve um momento com as mãos no rosto, e depois voltou ao rio. A areia caíralhe<br />

nos olhos.<br />

Então, Janoca levantou-se rapidamente e correu após ele.<br />

— Caiu-lhe nos olhos a areia, meu benzinho? — perguntou com voz sentida.<br />

Coitado do meu marido!<br />

E foi ela que arrastou Bezerra para dentro da água, onde, abraçando-o e<br />

dando-lhe beijos, começou a banhar-lhe o rosto e a pedir-lhe perdões ao mesmo<br />

tempo.<br />

Paulo aproveitou-se deste acidente para retirar-se do lugar, onde o acaso<br />

acabava de dar-lhe tão nojento e infame espetáculo. Estava maravilhado. A<br />

impudência e a nudez haviam deixado em seu espírito estranha impressão de<br />

assombro. Pensou logo em Maurícia, que ele tinha em conta de sua segunda mãe.<br />

“Quanto não deve ter ela padecido? — disse ele consigo. Agora acredito em todas<br />

as suas palavras; quem pratica o que acaba de praticar esse homem é capaz de<br />

todas as vilezas”. Paulo sentiu tamanha pena que, dados alguns passos, parou de<br />

novo e pôs-se a pensar no que testemunhara. A estranha visão apresentou-se-lhe<br />

outra vez diante dos olhos escandalizados, em tintas tão vivas como a realidade.<br />

“Oh, nunca supus que ele tivesse coragem para semelhante procedimento!”<br />

Voltou esse dia mais cedo do serviço. Tinha pressa de ver Maurícia. Quanto<br />

mais reconhecia a sua desgraça, mais se sentia na obrigação de ir em socorro da<br />

infeliz senhora. Nada lhe revelaria do que vira, mas trataria de cortar as relações<br />

criminosas que Bezerra e a mestiça mantinham. “Ela se sacrificou por mim; eu tenho<br />

o dever de lhe tornar o mais suave que puder o sacrifício”. Essa infame rapariga não<br />

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