Anais do III Encontro Nacional de Estudos sobre o Mediterrâneo ...
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AS RELAÇÕES ENTRE A NOBILITADE DE DANTE E A VALENTIOR PARS DE MARSÍLIO DE PÁDUA<br />
O Convivio <strong>de</strong> Dante Alighieri, escrito no início <strong>do</strong> século XIV, parte <strong>de</strong> uma chave<br />
metafórica: o pensa<strong>do</strong>r afirma que, sem ser um filósofo, tem a sorte <strong>de</strong> po<strong>de</strong>r compartilhar<br />
a mesa da sabe<strong>do</strong>ria com os filósofos, e se dispõe a oferecer um convite com os restos <strong>do</strong>s<br />
alimentos que precipitam <strong>de</strong>ssa mesa para to<strong>do</strong>s aqueles que, por motivos diversos, não<br />
tem acesso à mesma. O alimento que se comerá nesse convite, portanto, é um símbolo,<br />
revela<strong>do</strong> posteriormente, da sabe<strong>do</strong>ria.<br />
Esse nobre alimento da sabe<strong>do</strong>ria que Dante <strong>de</strong>seja repartir com os leitores <strong>de</strong> sua<br />
obra irá acompanha<strong>do</strong> <strong>de</strong> um pão que facilite sua assimilação. Também essa metáfora é<br />
esclarecida: o alimento terá a forma <strong>de</strong> canções, enquanto que o pão que o acompanha<br />
serão os comentários que as explicarão profusamente, até tal ponto que o conteú<strong>do</strong><br />
<strong>do</strong>utrinal, i<strong>de</strong>ológico e filosófico <strong>do</strong> Convivio resida <strong>de</strong> maneira indiscutível no comentário<br />
e não nas canções. (CASTILLO, 2005: 12-3).<br />
A partir <strong>de</strong> uma leitura mais precisa <strong>do</strong>s trata<strong>do</strong>s Convivio e Monarchia <strong>de</strong> Dante<br />
Alighieri, percebe-se a proposta <strong>de</strong> uma i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> nobiliárquica muito peculiar. Essa<br />
i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> é caracterizada por forjar um grupo que se reconhece segun<strong>do</strong> preceitos<br />
i<strong>de</strong>ológicos e culturais para alcançar sua coesão. A nobilita<strong>de</strong> nasce então por meio da<br />
união <strong>de</strong> uma vida política/pública com uma formação ampla (due felicitadi), um caminho<br />
pelo qual o homem nobre <strong>de</strong>ve passar para alcançar a perfeição <strong>de</strong> sua natureza. Existe<br />
uma valorização <strong>do</strong> pensamento em <strong>de</strong>trimento <strong>do</strong>s símbolos tradicionais da nobreza,<br />
como o sangue, os brasões e as posses materiais. Assim, a contemplação filosófica é o<br />
objetivo <strong>de</strong> toda organização humana, sen<strong>do</strong> esta o último fundamento <strong>do</strong> i<strong>de</strong>al<br />
monárquico. (LIBERA, 1999: 257).<br />
De qualquer mo<strong>do</strong>, durante o século XII o fenômeno da ascensão <strong>do</strong>s merca<strong>do</strong>res<br />
estava somente no início, nos tempos <strong>de</strong> Dante a antiga nobreza feudal teve <strong>de</strong> se combinar<br />
com a classe <strong>do</strong>s ricos merca<strong>do</strong>res. Assim, uma <strong>de</strong>finição precisa <strong>de</strong> um grupo social<br />
<strong>de</strong>ixava <strong>de</strong> existir, não havia mais como usar o termo nobre com certeza. O nobre e o<br />
merca<strong>do</strong>r já não tinham muitas diferenças entre si. Por essa razão, entre outras, Dante<br />
sentiu-se obriga<strong>do</strong> em discutir <strong>sobre</strong> qual era a essência, a origem, da nobreza, relacionada<br />
com uma combinação entre a perfeição da natureza e a providência divina.<br />
Dico adunque, che, se volemo riguar<strong>do</strong> avere <strong>de</strong> la comune consuetudine di<br />
parlare, per questo vocabulo “nobilita<strong>de</strong>” s’inten<strong>de</strong> perfezione di propria natura<br />
in ciascuna cosa. (DANTE ALIGHIERI. Convivio. IV, XVI.) (Grifo nosso).<br />
NÚCLEO DE ESTUDOS DA ANTIGUIDADE<br />
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