Anais do III Encontro Nacional de Estudos sobre o Mediterrâneo ...
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<strong>III</strong> ENCONTRO NACIONAL DE ESTUDOS SOBRE O MEDITERRÂNEO ANTIGO<br />
X FÓRUM DE DEBATES EM HISTÓRIA ANTIGA DA UERJ<br />
- 242 -<br />
Wen<strong>de</strong>ll <strong>do</strong>s Reis Veloso<br />
totalida<strong>de</strong> <strong>do</strong>s homens, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> que a humanida<strong>de</strong> mostra-se imanente a to<strong>do</strong>s os<br />
dualismos. Contu<strong>do</strong>, isto muda quan<strong>do</strong> ela, a humanida<strong>de</strong>, entra na argumentação como<br />
uma gran<strong>de</strong>za política <strong>de</strong> referência e produz separações em pólos opostos, não obstante a<br />
sua pretensão à totalida<strong>de</strong>. (KOSELLECK, 2006: 219-231) E é justamente isto que ocorre<br />
no perío<strong>do</strong> da Antiguida<strong>de</strong> Tardia.<br />
Em um contexto <strong>de</strong> crescente catocilização da socieda<strong>de</strong>, incluin<strong>do</strong> aí as estruturas<br />
políticas formais, os pertencentes à cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> Deus, os cristãos, confun<strong>de</strong>m-se cada vez<br />
mais com aqueles integra<strong>do</strong>s à estrutura política vigente.<br />
No primeiro parágrafo <strong>do</strong> capítulo oitavo <strong>de</strong> suas Confissões Agostinho empreen<strong>de</strong><br />
a seguinte reflexão:<br />
Acaso será em alguma parte e momento injusto amar a Deus <strong>de</strong> to<strong>do</strong> o coração,<br />
com toda a alma e com to<strong>do</strong> o entendimento e amar ao próximo como a nós<br />
mesmos? Por isso to<strong>do</strong>s os peca<strong>do</strong>s contra a natureza, como o foram os <strong>do</strong>s<br />
so<strong>do</strong>mitas, hão <strong>de</strong> ser <strong>de</strong>testa<strong>do</strong>s e castiga<strong>do</strong>s sempre e em toda parte, (...).<br />
(CONFISSÕES, Livro II, Cap. V<strong>III</strong>, p. 73)<br />
Po<strong>de</strong>mos perceber no seguinte trecho o estabelecimento <strong>de</strong> alguns peca<strong>do</strong>s,<br />
exemplifica<strong>do</strong> por um peca<strong>do</strong> sexual, como que antitéticos à natureza humana, ou seja, os<br />
seres sociais ti<strong>do</strong>s como <strong>de</strong>sviantes, como os so<strong>do</strong>mitas cita<strong>do</strong>s por nosso autor, são<br />
enquadra<strong>do</strong>s em uma relação antagônica e hierarquizante, ou, fazen<strong>do</strong> referência à<br />
supracitada obra <strong>de</strong> Koselleck, antitética e assimétrica, em que ocupam uma posição <strong>de</strong><br />
inferiorida<strong>de</strong> que nos sugere a potencialida<strong>de</strong> até mesmo <strong>de</strong> inexistência, uma vez que suas<br />
práticas contrariariam a própria natureza. 7<br />
Mais à frente encontramos:<br />
Com relação aos peca<strong>do</strong>s que são contra os costumes humanos, também hão <strong>de</strong><br />
ser evita<strong>do</strong>s <strong>de</strong> acor<strong>do</strong> com a diversida<strong>de</strong>s <strong>de</strong> costumes, a fim <strong>de</strong> que o pacto<br />
mútuo entre povos e nações, firma<strong>do</strong> pelo costume ou pela lei, não seja quebra<strong>do</strong><br />
por nenhum capricho <strong>de</strong> cidadão ou forasteiro, porque é in<strong>de</strong>corosa a parte que<br />
não se acomoda ao to<strong>do</strong>. (Ibi<strong>de</strong>m)<br />
Mais uma vez temos uma evidência da correlação operada por Agostinho entre<br />
peca<strong>do</strong> e uma assertiva negativa à humanida<strong>de</strong> <strong>de</strong> alguns seres sociais, e, portanto, uma<br />
correlação entre a falta <strong>de</strong> peca<strong>do</strong>s, ou luta contra estes, e uma assertiva positiva à<br />
humanida<strong>de</strong> <strong>de</strong> outros seres.<br />
7 A tentativa <strong>de</strong> controle da sexualida<strong>de</strong> humana, enquanto importante mecanismo <strong>de</strong> controle social <strong>do</strong><br />
cotidiano, possui importância capital na proposta <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong> cristã forjada por Agostinho <strong>de</strong> Hipona e foi<br />
estudada por nós anteriormente (VELOSO, 2010).