pelas veredas da psicose: o que se escreve? - CCHLA ...
pelas veredas da psicose: o que se escreve? - CCHLA ...
pelas veredas da psicose: o que se escreve? - CCHLA ...
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
61<br />
O termo lalangue foi cunhado por Lacan a partir de um lapso. Numa apre<strong>se</strong>ntação<br />
do <strong>se</strong>minário O saber do psicanalista, falava sobre dicionários de psicanáli<strong>se</strong> (Pontalis e<br />
Laplanche), dizendo num lapso vocabulário de filosofia ao invés de vocabulário de<br />
psicanáli<strong>se</strong>. Lacan vai, então, de Laplanche, vocabulário de psicanáli<strong>se</strong>, a Lalande,<br />
vocabulário de filosofia, deslizando até lalangue. Dessa forma, como afirma Barros (2008),<br />
“Lalangue surge a partir de uma operação de letras”.<br />
Do encontro traumático com a linguagem, pode-<strong>se</strong> dizer, uma primeira língua<br />
operou e fez marcas no corpo do vivente, <strong>se</strong> constituindo como a língua particular de ca<strong>da</strong><br />
sujeito –lalangue. Do encontro com es<strong>se</strong> real resta lalangue, parcela real <strong>da</strong> língua.<br />
Lalangue consiste nos detritos <strong>da</strong> fala do Outro materno <strong>que</strong> restam para o falante<br />
feito som, barulho <strong>que</strong> ficou dessa operação. A criança em contato com a linguagem, <strong>que</strong><br />
vem <strong>se</strong>mpre do Outro, abre mão <strong>da</strong> lalação, enquanto estando em alíngua, para adentrar<br />
num outro tempo lógico onde as palavras aderem e visam à significação, ao laço com o<br />
outro. No entanto, mesmo a criança <strong>se</strong> apropriando <strong>da</strong> fala do Outro para <strong>se</strong> constituir<br />
enquanto sujeito, nem tudo entra na significação, ficando um resto <strong>que</strong> insiste em retornar,<br />
um gozo não submetido à simbolização. É a língua dita materna. Alíngua é a língua<br />
particular de ca<strong>da</strong> sujeito, forja<strong>da</strong> a partir <strong>da</strong> língua materna.<br />
É comum ver nas crianças essa língua de gozo, alíngua, como foi possível<br />
testemunhar certa vez num atendimento. Uma <strong>da</strong>s crianças perguntou: E você sabe o nome<br />
<strong>da</strong> injeção <strong>que</strong> J. tomou? Dis<strong>se</strong>-lhe <strong>que</strong> não. L. logo responde com prontidão: Doutorbatil.<br />
Interrogo-lhe, ela responde: sim, doutorbatil. Nes<strong>se</strong> instante, a terceira criança dá<br />
gargalha<strong>da</strong>s e diz: doutorbatil, é bezetacil. O riso foi comum a todos, menos à autora do<br />
nome <strong>que</strong> só pôde rir ao atestar-lhe sua invenção. Dis<strong>se</strong>-lhe <strong>que</strong> doutorbatil era muito<br />
melhor <strong>que</strong> bezetacil, pois causou riso e não dor.<br />
Alíngua <strong>se</strong>rve para coisas inteiramente diferentes <strong>da</strong> comunicação. É o<br />
<strong>que</strong> a experiência do inconsciente mostrou, no <strong>que</strong> ele é feito de alíngua,<br />
essa alíngua <strong>que</strong> vocês sabem <strong>que</strong> eu a escrevo numa só palavra, para<br />
designar o <strong>que</strong> é a ocupação de ca<strong>da</strong> um de nós, alíngua dita materna, e<br />
não por na<strong>da</strong> dita assim.(LACAN, 1972-73/2008, p. 148).<br />
A psicanáli<strong>se</strong> é permea<strong>da</strong> pelo conceito de linguagem desde Freud, quando<br />
descobre o inconsciente, surgindo algo novo com o conceito de alíngua. Lacan, ao forjar<br />
es<strong>se</strong> termo, coloca a linguagem como posterior à alíngua. Isto significa <strong>que</strong> a linguagem já