pelas veredas da psicose: o que se escreve? - CCHLA ...
pelas veredas da psicose: o que se escreve? - CCHLA ...
pelas veredas da psicose: o que se escreve? - CCHLA ...
Create successful ePaper yourself
Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.
76<br />
belas artes ou a arte bruta. São citados, comentados, comercializados ou reproduzidos.<br />
Es<strong>se</strong>s objetos circulam, têm lugar no social, no Outro. São objetos <strong>que</strong> entram numa norma<br />
fálica, no circuito do de<strong>se</strong>jo. Mesmo <strong>que</strong> quando <strong>da</strong> criação o psicótico não visa a es<strong>se</strong><br />
reconhecimento ou aceitação do Outro já produz uma <strong>se</strong>paração deste.<br />
A fala na neuro<strong>se</strong> faz o furo do simbólico, mas <strong>se</strong> sabe quão evanescente ela é. A<br />
escrita, ao contrário, permite uma materiali<strong>da</strong>de, fixando, registrando, grafando algo do<br />
Real inalcançável e, a posteiori, reorganizando a cadeia significante rompi<strong>da</strong>.<br />
A escrita, diferente <strong>da</strong> fala, comporta e suporta a própria loucura. Ela suporta o <strong>se</strong>m<br />
<strong>se</strong>ntido <strong>que</strong> localiza o gozo, e assim um sujeito pode advir. A escrita possibilita ao sujeito<br />
costurar sua rede simbólica, na qual é tecido nes<strong>se</strong> próprio ato.<br />
Mais uma vez, utilizaremos Joyce para falar de sua escrita como tendo efeito de<br />
suplência. A escrita joyceana não pretende o reconhecimento do outro <strong>que</strong> é próprio do<br />
neurótico. Trata-<strong>se</strong> de perverter a linguagem, fazer um outro uso. Uma linguagem <strong>que</strong><br />
rompe com a produção de <strong>se</strong>ntido - <strong>que</strong> re<strong>que</strong>r <strong>se</strong>mpre outros - incidindo no Real.<br />
Joyce com sua obra faz uma atadura dos registros. Além disso, sua escrita é uma<br />
produção <strong>que</strong> institui um laço. Conforme diz Laurent (1995), a escrita de Joyce<br />
“coletiviza”. Fazer os outros coletivizarem em torno de sua obra é diferente de constituir<br />
um delírio, es<strong>se</strong> é um trabalho apenas do sujeito consigo mesmo, <strong>se</strong>m espaço para o laço.<br />
Joyce, no entanto, vai além, fazendo para si um nome 29 . Desabonado do inconsciente, <strong>se</strong>m<br />
a inscrição do significante paterno, Joyce cria um nome para si <strong>que</strong> lhe permite <strong>se</strong> manter<br />
no fálico. Sua escrita aparelha o gozo do Outro. Joyce sabe <strong>que</strong> o pai é capenga, <strong>que</strong> não<br />
pôde lhe <strong>da</strong>r garantias; passa, então, a confiar em <strong>se</strong>u sintoma.<br />
De fato, Joyce não pôde contar com o Nome-do-Pai. O <strong>que</strong> veio em lugar<br />
dele foi “a vontade de fazer um nome para si”, <strong>que</strong> é preciso não reduzir à<br />
vontade de reconhecimento pelo maior número possível de pessoas.<br />
Joyce quis fazer um nome <strong>que</strong> surtis<strong>se</strong> efeito, <strong>que</strong> pu<strong>se</strong>s<strong>se</strong> para trabalhar,<br />
<strong>que</strong> coletivizas<strong>se</strong> [...] (LAURENT, 1995, p.136).<br />
Joyce é um paradigma, pois con<strong>se</strong>gue “[...] fazer um nome próprio <strong>que</strong> coletiviza,<br />
aproximando-<strong>se</strong> com isso <strong>da</strong> função do significante mestre. Foi produzindo es<strong>se</strong> nome <strong>que</strong><br />
Joyce <strong>se</strong> manteve no <strong>se</strong>ntido fálico.” (LAURENT, 1995, p.136). De outro modo, enquanto<br />
o neurótico tem um ponto de referência ao qual atribuir to<strong>da</strong>s as suas significações (o<br />
29 É válido destacar <strong>que</strong> não nos deteremos à <strong>que</strong>stão do sujeito fazer um Nome. Es<strong>se</strong> fato só foi destacado<br />
para falar de Joyce.