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604 Algumas notas sobre a democracia deliberativa...<br />
sua concretização. O horizonte a ser alcançado, segundo Habermas, é através do<br />
parâmetro descrito por ele, ou seja, pela via da comunicação que se deve buscar um<br />
ideal, já determinado num conceito regulativo. O conceito de comunicação é diretriz<br />
a ser seguida e, assim, não há uma busca ideal, fixa, mas, sobretudo, uma meta<br />
traçada, segundo as concepções já estudadas, que serão concretizadas em cada<br />
sociedade de acordo com a possibilidade existente.<br />
A norma jurídica precisa de algo mais na concepção contemporânea – e<br />
complexa – de democracia. A formalidade legislativa não responde, sozinha, ao<br />
complexo rol de anseios sociais que a contemporaneidade encerra, necessitandose<br />
a ela somar-se a aderência social, ou legitimidade social. Para Habermas, tanto a<br />
validade social, como a obediência fática “variam de acordo com a fé dos membros da<br />
comunidade de direito na legitimidade, e esta fé, por sua vez, apoia-se na suposição<br />
da legitimidade, isto é, na fundamentalidade das respectivas normas” 34 . Prima-se de<br />
critérios que intensifiquem o nível de legitimidade social de uma norma, trabalhados<br />
no sentido da qualificação da participação popular, na teoria deliberativa.<br />
A parca quota de participação dos cidadãos nos espaços de integração, tais<br />
como em consultas públicas, por exemplo, é também resultado de uma cultura de<br />
não participação, que se encontra evidente em países considerados jovens, ou de<br />
modernidade tardia, como é o caso do Brasil. Existe mais: existe uma corrente forte –<br />
embora jovem – que desafia a cultura apática em busca de uma desestruturação do<br />
status quo. O ranço oligárquico do poder centralizador da democracia representativa<br />
não é – não pode – ser combatido com a inércia. Nesse sentido, os Conselhos<br />
seriam espaços de interação que se caracterizam por um tipo de distribuição do<br />
poder justificada pela realização de uma tarefa comum, de interesse comum, para o<br />
cumprimento de uma responsabilidade comum 35 .<br />
A deliberação é o rompimento com a necessidade de instrumentalização para<br />
a justificação das ações sociais, e, ao mesmo tempo, a possibilidade de uma maior<br />
responsabilidade popular, nas questões que lhe são afetas. Para Leal,<br />
[...] não há dúvidas de que a comunidade precisa assumir sua quota<br />
de responsabilidade no processo, primando para que as relações<br />
sociais sejam medidas pelo reconhecimento de obrigações, direitos<br />
e representação de interesses, de tal forma que se torne factível a<br />
construção de espaços públicos que confiram legitimidade aos<br />
conflitos e nos quais a medida de equidade e a regra de justiça venham<br />
a ser alvo do debate e de uma permanente interlocução, construída<br />
através de procedimentos de negociações abertos à pluralidade de<br />
problemas e temas emergentes que não encontram lugar no espaço<br />
unitário estatal, que deslocam o poder do Estado como árbitro<br />
exclusivo e ampliam as fronteiras das relações de direito para além<br />
34<br />
HABERMAS, Jürgen. Direito e democracia: entre facticidade de validade. v.1. Tradução de Flávio<br />
Beno Siebeneichler. Rio de janeiro: Tempo Brasileiro,1997, p. 50.<br />
35<br />
COSTA, Vanda Maria Ribeiro. Teoria democrática e conselhos de política social. In: BRAVO, Maria<br />
Inês Souza; PEREIRA, Potyara A. P. Política Social e Democracia. São Paulo: Cortez, 2002, p. 88.