Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama
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www.nead.unama.br<br />
estava quase todo dilacerado e pelo pescoço da moça marejava o sangue, <strong>de</strong>ntre<br />
arranhões extensos.<br />
Quando Mariquinhas recuper<strong>ou</strong> a calma e pô<strong>de</strong> falar, interrogada pelos seus<br />
insistentemente, respon<strong>de</strong>u, fundindo-se em pranto.<br />
— Foi... Foi ... Um quilombola!<br />
O irmão <strong>de</strong> Mariquinhas, assim como seu pai tinham corrido imediatamente<br />
atraídos pelos gritos, mas ao passo que Francisco Benedito correu para a frente da<br />
casa, Juca Benedito dirigira-se para os fundos.<br />
Quando cheg<strong>ou</strong> à casa, o rapaz pergunt<strong>ou</strong> se não tinha estado aí o ex-feitor.<br />
— Não! Respon<strong>de</strong>u Antonica, admirada.<br />
— Pois não se me dava jurar que eu vi Manuel João correndo para <strong>de</strong>ntro da<br />
mata, e até lhe fiquei obrigado pelo serviço. Você não o viu por lá, Mariquinhas?<br />
A moça mene<strong>ou</strong> negativamente a cabeça, mas os seus soluços como que<br />
dobravam <strong>de</strong> força.<br />
Convencido <strong>de</strong> que era o ex-feitor o autor dos ferimentos <strong>de</strong> sua filha, o<br />
agregado foi pedir providências ao seu amigo inspetor, mas este respon<strong>de</strong>u-lhe<br />
serenamente:<br />
— Descanse, seu Chico; eu por ora não posso fazer nada; as eleições estão<br />
próximas e eu não hei <strong>de</strong> recrutar o rapaz que já me prometeu votar conosco. Em<br />
passando as eleições fale comigo.<br />
O <strong>de</strong>sengano era por <strong>de</strong>mais expressivo e não havia contar com a punição<br />
do ex-feitor.<br />
Todos esses acontecimentos que sobremaneira entristeciam o agregado<br />
tinham influência bem diversa no espírito <strong>de</strong> Antonica.<br />
Firme na sua afeição pelo fazen<strong>de</strong>iro, cujo caráter nobre e generoso<br />
conhecia perfeitamente, cada uma das <strong>de</strong>cepções que seu pai recebia cada ofensa<br />
que faziam-lhe os seus supostos amigos eram motivo <strong>de</strong> alegria para a moça que<br />
<strong>de</strong>sta sorte via vingado o eleito dos seus sonhos.<br />
As suas faces que tinham perdido a cor agradável da saú<strong>de</strong>, iam agora<br />
readquirindo-a, e os lábios, que pareciam ter <strong>de</strong>saprendido as crispações leves dos<br />
sorrisos joviais, já abriam-se agora, rubros como pétalas <strong>de</strong> rosa, para darem<br />
passagem a francas risadas.<br />
Os olhos, amortecidos <strong>ou</strong>trora, tinham presentemente o brilho peculiar da<br />
tranqüilida<strong>de</strong> e os olhares escarninhos e <strong>ou</strong>sados que lhe eram congênitos.<br />
Dava-se em Antonica uma verda<strong>de</strong>ira ressurreição: as cinzas tristes do<br />
coração da moça, as mortas quimeras da mocida<strong>de</strong> recompunham-se e afeiçoavamse<br />
pelo divino galvanismo do amor.<br />
Antonica era <strong>de</strong> novo feliz, porque não contava com a inconstância da<br />
fortuna.<br />
A amiza<strong>de</strong> do violeiro e do agregado não <strong>de</strong>mor<strong>ou</strong> a reatar-se por vínculos<br />
indissolúveis na vida. A necessida<strong>de</strong> recíproca era o nó que os prendia e <strong>de</strong>sdá-lo<br />
era um perigo cujas conseqüências funestas já a experiência podia aquilatar.<br />
A inativida<strong>de</strong>, em que Francisco Benedito jazeu durante o tempo da<br />
indisposição com o violeiro, provava exuberantemente o acerto da aliança, e por isso<br />
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