Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama
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www.nead.unama.br<br />
acerca <strong>de</strong> <strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong>, percebi que não havia no conselho aquela imparcialida<strong>de</strong><br />
que era <strong>de</strong> esperar em assunto <strong>de</strong> tão gran<strong>de</strong> alcance.<br />
Passando-se a votar o primeiro quesito relativo ao preto Domingos, certifiqueime<br />
do meu juízo, e, ainda mais, fui obrigado a assistir a um gran<strong>de</strong> escândalo.<br />
Proce<strong>de</strong>ndo-se à contagem das cédulas o secretário do conselho cont<strong>ou</strong><br />
treze, e como era natural reclamei, e pedi verificação. Nova contagem do secretário<br />
cheg<strong>ou</strong> ao mesmo número. Pedi então que se proce<strong>de</strong>sse a nova votação e fui<br />
acompanhado por mais cinco jurados, porém o presi<strong>de</strong>nte enten<strong>de</strong>u melhor proce<strong>de</strong>r<br />
por si mesmo a contagem e c<strong>ou</strong>sa singular apareceram apenas doze cédulas.<br />
Lidos os votos encontram-se sete cédulas reconhecendo o crime e cinco<br />
apenas negando-o.<br />
Com gran<strong>de</strong> pasmo certifiquei-me <strong>de</strong> que os cincos jurados tinham negado o<br />
crime, e eu com eles.<br />
— Mas isto é uma iniqüida<strong>de</strong>; é preciso arrancar a máscara a esse homem<br />
que tão baixamente abus<strong>ou</strong> da sua posição.<br />
— Eu não quero fazer juízos temerários, porém, entendo que este fato <strong>de</strong>ve<br />
ser já verificado, para <strong>de</strong>scanso da consciência <strong>de</strong> todos.<br />
— Mas não há dúvida meu amigo; havia com efeito treze cédulas e uma<br />
<strong>de</strong>las que dizia não foi escamoteada pelo presi<strong>de</strong>nte, que <strong>de</strong>posit<strong>ou</strong> na urna duas<br />
cédulas afirmando o crime. Oh! Havemos <strong>de</strong> sabê-lo, eu lho juro; o Sr. invoc<strong>ou</strong> a<br />
minha honra <strong>de</strong> magistrado, eu comprometo-a.<br />
O Sr. Seberg saiu revelando no semblante o alívio intimo que<br />
experimentava, e o Sr. Apolinário sentando-se logo à escrivaninha ofici<strong>ou</strong> ao juiz <strong>de</strong><br />
direito, narrando a comunicação que acabava <strong>de</strong> lhe ser feita.<br />
Infelizmente a questão, que parecia fácil <strong>de</strong> ser dirimida, morreu abafada nas<br />
pastas do juízo municipal.<br />
Uma grave enfermida<strong>de</strong> obrig<strong>ou</strong> o digno substituto a p assar a vara a <strong>ou</strong>tro<br />
magistrado, e este, oficiado pela autorida<strong>de</strong> superior para continuar nas pesquisas a<br />
respeito, discutiu o assunto e <strong>de</strong>u-o por esgotado, sem inquérito.<br />
Na tar<strong>de</strong> do dia em que Seberg <strong>de</strong>u o honroso passo a favor <strong>de</strong> Domingos,<br />
foram con<strong>de</strong>nados também à morte Faustino Pereira da Silva e Florentino, e todos<br />
os réus enviados para as prisões da capital.<br />
Usando do recurso ordinário que lhes restava, o tribunal da relação não se<br />
dign<strong>ou</strong> atendê -l os, negando-se a conhecer das apelações por não ser caso <strong>de</strong>las.<br />
Este <strong>de</strong>spacho está também na apelação do réu Domingos, em que foram<br />
reconhecidas circunstâncias agravantes por número <strong>de</strong> votos superior ao que<br />
confirmava o crime!<br />
A <strong>de</strong>silusão do fazen<strong>de</strong>iro tinha chegado ao auge; não lhe era mais<br />
permitido uma única esperança, porque sabia bem que o po<strong>de</strong>r mo<strong>de</strong>rador não<br />
aten<strong>de</strong>ria à sua súplica.<br />
Acresce que para agravar ainda mais o suplício moral dos con<strong>de</strong>nados o<br />
processo seguia com dolorosa morosida<strong>de</strong>, e só após dois anos <strong>de</strong> espera veio o<br />
golpe final.<br />
Domingos, intimado a fazer petição <strong>de</strong> graça, não a fez no prazo <strong>de</strong> oito dias<br />
conforme a lei, e portanto estava irremediavelmente con<strong>de</strong>nado.<br />
Pobre escravo! Como po<strong>de</strong>ria ele compreen<strong>de</strong>r, <strong>ou</strong>vindo a intimação do<br />
escrivão, que uma <strong>de</strong>mora custar-lhe-ia a vida?<br />
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