12.04.2013 Views

Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama

Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama

Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama

SHOW MORE
SHOW LESS

You also want an ePaper? Increase the reach of your titles

YUMPU automatically turns print PDFs into web optimized ePapers that Google loves.

www.nead.unama.br<br />

que estava zangado comigo. Só fiquei certa <strong>de</strong> que seu capitão estava triste, porque<br />

já tão noite e ainda está aqui fora.<br />

Como quem <strong>de</strong>sperta por uma sacudi<strong>de</strong>la brutal, o fazen<strong>de</strong>iro levant<strong>ou</strong>-se e<br />

correu os olhos em torno <strong>de</strong> si, e <strong>de</strong>pois para as mãos, em uma das quais tinha a<br />

carta amarrotada.<br />

Antonica, assustada por esses movimentos, fic<strong>ou</strong> imóvel, como se os pés se<br />

lhe tivessem grudado ao solo, e já começava a repreen<strong>de</strong>r-se da nova imprudência,<br />

esperando uma das explosões <strong>de</strong> gênio, tão fáceis em <strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong>.<br />

Mas em vez <strong>de</strong> censura temida, encontr<strong>ou</strong> a benevolência e se as mãos, se<br />

os gestos não se aveludaram em afagos, a voz transud<strong>ou</strong> uma compaixão grata e<br />

amiga.<br />

— Você faz-me pena, disse <strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong>; não conhece a vida, e vai até o<br />

precipício, querendo arrastar consigo aqueles a quem estima. Deixa-me em paz,<br />

Antonica. Ninguém melhor do que eu po<strong>de</strong> avaliar o seu sofrimento, mas tenho<br />

necessida<strong>de</strong> <strong>de</strong> ser cruel. O contrário era a minha <strong>de</strong>sonra, o <strong>de</strong>sassossego <strong>de</strong> toda<br />

a minha vida e a sua <strong>de</strong>sgraça, Antonica. Hoje você ficaria satisfeita com as minhas<br />

carícias; porém amanhã, quando os seus pais lhe fechassem as portas, quando<br />

todos apontassem-na entre mofas e escárnios, teria <strong>de</strong> amaldiçoar-me. Nem você<br />

imagina quanto algumas palavras que lhe tenho dito custam-me em arrependimento.<br />

Julgo-me criminoso ante os meus filhos e minha mulher, e entretanto a minha estima<br />

por si não é senão a <strong>de</strong> um pai. Tenho dó <strong>de</strong> si.<br />

— Mas, meu Deus, que <strong>de</strong>sgraça é a minha que não posso nem estar ao pé<br />

<strong>de</strong> vosmecê um instante, sem que logo me man<strong>de</strong> embora; seu capitão po<strong>de</strong> ficar<br />

horas inteiras a olhar para um papel e não po<strong>de</strong> me ver nem um instantinho.<br />

Buscando comover, a moça não fez mais do que avivar ainda mais na mente<br />

<strong>de</strong> <strong>Coqueiro</strong> a responsabilida<strong>de</strong> que lhe cabia na cena que se passava.<br />

O papel preferido era a carta em que estava gravada a suspeita da consorte<br />

do fazen<strong>de</strong>iro, e lembrá-lo importava justificar a <strong>de</strong>licada repreensão que no papel<br />

ocultava.<br />

— Não <strong>de</strong>ve consentir, continu<strong>ou</strong> o fazen<strong>de</strong>iro, porque tenho família, porque<br />

tenho dignida<strong>de</strong>. Basta já <strong>de</strong> comprometimentos; é a sua e minha perdição. Se<br />

alguém aparecesse agora, este papel que você vê teria toda a razão, e minha<br />

mulher po<strong>de</strong>ria com justiça acusar-me.<br />

— E que tem sua mulher e seus filhos com a minha amiza<strong>de</strong>? Pois que me<br />

matem.<br />

— L<strong>ou</strong>quinha, faz-me pena.<br />

— Paciência, mas é assim; matem-me se quiserem, mas hei <strong>de</strong> estimá-lo<br />

sempre.<br />

O silêncio perme<strong>ou</strong> a tristeza <strong>de</strong>sses dois corações.<br />

Passado algum tempo, <strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong>, como se h<strong>ou</strong>vesse encontrado uma<br />

solução <strong>de</strong>cisiva para a sua situação, peg<strong>ou</strong> da mão <strong>de</strong> Antonica e pergunt<strong>ou</strong>-lhe<br />

com voz comovida.<br />

— Então estima-me muito, Antonica.<br />

A moça respon<strong>de</strong>u movendo afirmativamente a cabeça.<br />

92

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!