Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama
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Afinal o ruído dissip<strong>ou</strong>-se e a voz <strong>de</strong> <strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong>, trêmula <strong>de</strong> comoção,<br />
pô<strong>de</strong> ser distintamente <strong>ou</strong>vida.<br />
Depois <strong>de</strong> expor as suas relações com Francisco Benedito durante quatro<br />
anos, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> a sua chegada no sítio e moradia na casa próxima à em que residia a<br />
sua família, até o espancamento que lhe foi feito pelo agregado; exposta a marcha<br />
do processo, o procedimento <strong>de</strong> Licério e a indisposição <strong>de</strong> Lúcio Ribeiro e Manuel<br />
João; <strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong> <strong>de</strong>clar<strong>ou</strong> que tinha gran<strong>de</strong> parte <strong>de</strong> Macabu por sua inimiga,<br />
mas que não sabe a quem atribuir o assassinato da família do seu agregado; seria<br />
fazer juízos temerários.<br />
A voz fortaleceu-se então e adquiriu timbre que encarnava em si a maldição<br />
e ao mesmo tempo a resignação.<br />
— Quanto à imputação que me fazem <strong>de</strong> semelhante crime, eu, perante o<br />
Sr. juiz e os Srs. jurados, perante Deus e o povo, <strong>de</strong>claro que est<strong>ou</strong> inocente: tal não<br />
man<strong>de</strong>i fazer!<br />
Prolongada hilarida<strong>de</strong> nas galerias recebeu este brado da consciência<br />
flagelada do fazen<strong>de</strong>iro, que <strong>ou</strong>vindo a gargalhada alvar dos insensatos, caiu como<br />
que fulminado sobre o escabelo infamante.<br />
O infeliz Domingos nem podia ao menos ligar os fatos para expô-los; limit<strong>ou</strong>se<br />
a respon<strong>de</strong>r às perguntas da perspicácia doentia do magistrado, e concluiu por<br />
afirmar com a maior sincerida<strong>de</strong>: eu não fiz crime!<br />
O conselho retir<strong>ou</strong>-se para a sala secreta, mas <strong>de</strong>sta vez a sua <strong>de</strong>mora já<br />
não abria horizonte aos alvores da esperança no coração <strong>de</strong> <strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong>,<br />
estortegado pela cruel certeza <strong>de</strong> que seria novamente con<strong>de</strong>nado.<br />
O sol do dia vinte e oito <strong>de</strong> março <strong>de</strong> 1853 <strong>de</strong>scambava triste para o<br />
oci<strong>de</strong>nte, e para ele como para um caráter nobre e leal estava perto o ocaso; a<br />
região das sombras e dos mistérios.<br />
A expectativa dos assistentes, posta por muito tempo a mal sofridos tratos, foi<br />
enfim satisfeita: os jurados apresentaram-se com a <strong>de</strong>sejada resposta aos quesitos.<br />
Confirmaram por unanimida<strong>de</strong> que o réu Manuel da <strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong> tinha<br />
mandado matar Francisco Benedito, sua mulher e seus filhos, alguns dos quais<br />
menores <strong>de</strong> sete anos.<br />
Por oito votos reconheciam as circunstâncias agravantes <strong>de</strong> lugar ermo à<br />
noite, e tentativa <strong>de</strong> incêndio; por unanimida<strong>de</strong> as agravantes: motivo frívolo <strong>ou</strong><br />
reprovado, premeditação, entrada na casa do ofendido, e ajuste com os executores<br />
da matança.<br />
Aos quesitos formulados acerca do réu Domingos, respon<strong>de</strong>u o mesmo<br />
conselho confirmando por sete votos que o réu tinha morto a família <strong>de</strong> Francisco<br />
Benedito; por nove reconhecendo as circunstâncias agravantes <strong>de</strong> lugar ermo e <strong>de</strong><br />
noite, tentativa <strong>de</strong> incêndio, motivo reprovado <strong>ou</strong> frívolo; por <strong>de</strong>z, a agravante <strong>de</strong> ter<br />
entrado na casa do ofendido com o fim <strong>de</strong> matá-lo; por sete a circunstância <strong>de</strong><br />
premeditação; por oito negando atenuantes a favor do réu, que não foi violentado<br />
por força irresistível, nem medo.<br />
O magistrado que presidia a sessão <strong>de</strong>u então a sentença marcada pelo<br />
código — a pena <strong>de</strong> morte; e apel<strong>ou</strong> <strong>de</strong>sta <strong>de</strong>cisão.<br />
— Ai! Resmung<strong>ou</strong> o <strong>de</strong>sgraçado Domingos, os brancos são cegos; não<br />
querem ver a verda<strong>de</strong>!<br />
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