12.04.2013 Views

Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama

Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama

Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

www.nead.unama.br<br />

Chiquinha dando uma das francas risadas características dos filhos da roça,<br />

exclam<strong>ou</strong>:<br />

— Uê! Seu Sebastião subiu a serra, gente!<br />

O rapaz animado pelo dito e a risada <strong>de</strong> Chiquinha <strong>de</strong>sembarc<strong>ou</strong>, segurando<br />

nas mãos a corda que amarrava o banco da proa da canoa, e pôs-se a perfurar o<br />

barro do porto com o cabo do remo, dizendo:<br />

— Eu pensei que você tinha-se zangado comigo.<br />

— Não me zanguei, não; foi só para você não se meter no que não sabe.<br />

— Então eu não sei bater r<strong>ou</strong>pa?<br />

— Qual sabe o quê; isto não é viola.<br />

— Pois fique sabendo que a gente quando quer sabe tudo; até amar.<br />

— Ora isto. . . tem muito que saber..<br />

— E tem mesmo; como eu você não acha <strong>ou</strong>tro.<br />

— Agora, como se faz na caixinha dos três <strong>de</strong>sejos, diga, seu Sebastião — a<br />

quem ama?<br />

— A você! ...<br />

— Gentes! Como você está adiantado! Exclam<strong>ou</strong> Chiquinha, <strong>de</strong>pois <strong>de</strong> ter<br />

contraído os lábios corados num temo muxoxo.<br />

Des<strong>de</strong> esse dia, Sebastião Pereira começ<strong>ou</strong> a sentir gran<strong>de</strong> pena pela<br />

família do Chico Benedito, e a ter manifesta aversão pela familiarida<strong>de</strong> <strong>de</strong> <strong>Coqueiro</strong><br />

junto <strong>de</strong>sta família.<br />

A partir <strong>de</strong> uma noite em que, sobraçado o seu ponche <strong>de</strong> baeta negra,<br />

forrado <strong>de</strong> flanela vermelha; posto no alto da cabeça o chapéu-do-chile com largas<br />

fitas negras pen<strong>de</strong>ntes, o Viana da venda entr<strong>ou</strong> na casa <strong>de</strong> Chico Benedito, a sua<br />

alma <strong>de</strong> ten<strong>de</strong>iro começ<strong>ou</strong> a pesar <strong>ou</strong>ro fio os gêneros da vendola e a recordação <strong>de</strong><br />

sá Antonica.<br />

A sala sem assoalho, com o chão aci<strong>de</strong>ntado por altos e baixos, ornada por<br />

uns bancos <strong>de</strong> pau, umas caixas e uma mesa velha, em que assentava um oratório<br />

junto do qual espirravam dois can<strong>de</strong>eiros <strong>de</strong> folha-<strong>de</strong>-flandres; semelhante sala luzia<br />

na memória do homem com as cintilações <strong>de</strong> um paraíso <strong>de</strong> amor.<br />

É que ao entrar fora recebido por uma estrepitosa ovação, e <strong>ou</strong>viu à<br />

Antonica chamar os seus quase quarenta anos um mocetão bonito.<br />

Não há alma <strong>de</strong> ten<strong>de</strong>iro da roça, por menos vaidosa que seja, fortalecida<br />

para não penhorar-se com semelhantes saudações.<br />

Naquela noite o Viana, naturalmente folgazão, lev<strong>ou</strong> as lampas aos mais<br />

pago<strong>de</strong>iros; tinha metido no mesmo chinelo o Sebastião e Manuel João, que<br />

improvisavam estrofes com a fluência do jorro <strong>de</strong> uma cascata, e com as mesmas<br />

quedas.<br />

Achava-se aí por ter merecido um convite <strong>de</strong> Francisco Benedito para uma<br />

brinca<strong>de</strong>ira <strong>de</strong> Santo Antônio.<br />

O programa da festa era uma ladainha, e em seguida um fado com muitas<br />

raparigas, um leitão assado, dois garrafões <strong>de</strong> aguar<strong>de</strong>nte, <strong>ou</strong> melhor — <strong>de</strong> boa<br />

cana, e um garrafão <strong>de</strong> vinho, o qual fora dado <strong>de</strong> presente à Antonica, pelo<br />

compadre capitão, o <strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong>, que fora passar a festa na cida<strong>de</strong>.<br />

Na casa não havia nicas, era casa <strong>de</strong> pobre; e o Sr. Viana estava ali como<br />

se estivesse na sua venda. Podia também levar quem lhe apr<strong>ou</strong>vesse.<br />

21

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!