12.04.2013 Views

Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama

Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama

Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

www.nead.unama.br<br />

Sob o sol ar<strong>de</strong>nte, a moça, com um cestinho à cabeça e um longo e fino<br />

caniço <strong>de</strong>itado sobre ele, atravess<strong>ou</strong> o campo em direção ao porto, on<strong>de</strong> assentado<br />

à sombra <strong>de</strong> uma enorme figueira brava esperavam-na o pai e os irmãos.<br />

Com um sorriso ela repreen<strong>de</strong>u as irmãs, lembrando-lhes que bem podiam<br />

ter ido almoçar em casa, para não a obrigarem a trazer tanto peso.<br />

À proporção que falava, Antonica assentava sobre a grama os pratos que<br />

tirava do cestinho, e afinal, segurando no caniço, pôs-se a <strong>de</strong>senrolar-lhe a linha e a<br />

experimentar-lhe a estrova e o anzol.<br />

— Eu como já almocei, disse Antonica, v<strong>ou</strong> pescar um bocadinho.<br />

— Eu logo vi que você falava <strong>de</strong> barriga cheia, interveio o irmão.<br />

A moça foi assentar-se à margem do rio em frente a um lugar on<strong>de</strong> as águas<br />

negras e morosas remanseavam, abrindo em rodamoinho silenciosos sorvedoiros.<br />

Estava a p<strong>ou</strong>ca distância dos seus, que em grupo riam e conversavam, ora<br />

menoscabando, ora elogiando a refeição e o aparelho.<br />

— Como estão bem lavados os pratos!<br />

— E as facas como estão amoladas; parecem navalhas.<br />

— Este quitute foi temperado por Antonica.<br />

— Vocês assim espantam-me os peixes, grit<strong>ou</strong> Antonica.<br />

— É gosto, observ<strong>ou</strong> Mariquinhas, não façam barulho que eu quero assar no<br />

<strong>de</strong>do a pescaria.<br />

— Pois, sim senhores; <strong>de</strong> criada vai o Viana bem arranjado; é papa fina.<br />

Esta consi<strong>de</strong>ração, formulada por Francisco Benedito, foi recebida com uma<br />

longa risada dos filhos, que assim <strong>de</strong>monstravam aprovar o gracejo paterno. Quem<br />

estivesse ao pé <strong>de</strong> Antonica, veria, porém, que ela bem longe <strong>de</strong> acompanhar o<br />

acolhimento jovial ao gracejo, impressionara-se dolorosamente com ele.<br />

Não sorriu mais os seus tardos sorrisos e a pali<strong>de</strong>z como que se lhe<br />

aument<strong>ou</strong> nas faces.<br />

Os olhos amortecidos e avermelhados pren<strong>de</strong>ram-se-lhe como que<br />

fascinados na superfície da corrente, e, apesar das amigáveis provocações que lhe<br />

eram dirigidas, nada respondia.<br />

A linha, cujo anzol boiava à flor das águas, <strong>de</strong>ixava evi<strong>de</strong>nte que Antonica<br />

não prestava a mínima atenção à pesca. Outro cuidado a impressionava, e este<br />

brot<strong>ou</strong>-lhe no soluçado <strong>de</strong> um canto:<br />

— Moço fidalgo da corte<br />

Se encant<strong>ou</strong> <strong>de</strong> D. Branca;<br />

A moça foge aos amores,<br />

O seu pranto não se estanca.<br />

Já tem véu, já tem grinalda,<br />

Tem sapatos <strong>de</strong> cetim,<br />

Da cor que tem a neblina<br />

E as asas do querubim.<br />

Chega o dia do noivado<br />

Branca triste inclina a fronte,<br />

65

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!