12.04.2013 Views

Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama

Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama

Motta Coqueiro ou a Pena de Morte - Unama

SHOW MORE
SHOW LESS

Create successful ePaper yourself

Turn your PDF publications into a flip-book with our unique Google optimized e-Paper software.

www.nead.unama.br<br />

— Foi o que impediu-me e hoje se eu lhe <strong>de</strong>sse tal lugar, os genros<br />

mudavam-me até o sitio com as casas e tudo.<br />

— Agora é que é aturar o compadre; se ele sem motivo nenhum andava<br />

sempre em gran<strong>de</strong> gala, quanto mais agora que tem razão para estar alegre.<br />

— É verda<strong>de</strong>; há <strong>de</strong> ficar insuportável; o que vale é que eu já lhe disse que<br />

tratasse <strong>de</strong> fazer a sua casa.<br />

— E será bom falar-lhe sempre; não <strong>de</strong>ixá-lo dormir.<br />

A conversa <strong>de</strong>svi<strong>ou</strong>-se <strong>de</strong>ste ponto sendo substituída pelo das trivialida<strong>de</strong>s<br />

domésticas, e algumas medidas urgentes, no enten<strong>de</strong>r da senhora.<br />

Uma <strong>de</strong>las sustentada com mais calor e aferro era a <strong>de</strong> apressar-se o corte<br />

da ma<strong>de</strong>ira. A razão oculta do entusiasmo da senhora na sustentação <strong>de</strong>sta<br />

urgência era a sua antipatia pela residência no sitio, obrigatória agora pelos<br />

interesses pecuniários da casa, muito respeitados pela senhora.<br />

— Descanse, afirm<strong>ou</strong>-lhe <strong>Motta</strong> <strong>Coqueiro</strong>, <strong>de</strong>ntro em quinze dias hei <strong>de</strong><br />

começar a carrear a ma<strong>de</strong>ira, e com certeza <strong>de</strong>ntro em um mês po<strong>de</strong>remos mudarnos<br />

para a cida<strong>de</strong>.<br />

— Deus o permita; não po<strong>de</strong> haver lugar mais triste no mundo do que este<br />

sítio; parece um lugar amaldiçoado. Por minha vonta<strong>de</strong>, <strong>Motta</strong>, você <strong>de</strong>sfazia-se<br />

<strong>de</strong>stas terras.<br />

— E o resultado era não encontrar facilmente <strong>ou</strong>tras com tão boas ma<strong>de</strong>iras.<br />

— É o que não falta por ai.<br />

Sempre que a conversa sobre tal assunto chegava a este ponto, os esposos<br />

por uma inspiração do bom senso passavam a ocupar-se <strong>de</strong> <strong>ou</strong>tras matérias,<br />

quando não a interrompiam <strong>de</strong> todo.<br />

Na noite em que nos achamos a conversação teve o seu ponto final no da<br />

última frase da senhora, e a família, levantando-se da mesa, cada um <strong>de</strong> per si, foi<br />

para os seus aposentos.<br />

Daí a p<strong>ou</strong>co o sono fez silenciar toda a casa, exceto uma saleta on<strong>de</strong> o<br />

moleque Carlos, <strong>de</strong>itado <strong>de</strong> costas sobre uma esteira, posto um dos braços sob a<br />

cabeça, com a boca escancarada roncava forte e continuadamente.<br />

Cinco dias <strong>de</strong>correram sem que nenhum sucesso importante viesse<br />

articular-se aos que <strong>de</strong>ixamos narrados. A feiticeira e a cri<strong>ou</strong>la pareciam ter<br />

esquecido o plano <strong>de</strong> combate traçado em palavras cabalísticas. No eito e à noite ao<br />

voltar â casa não se trocavam senão as saudações usuais, e isto mesmo friamente.<br />

A astuta africana prevenia assim quaisquer suspeitas, que porventura<br />

pu<strong>de</strong>ssem gerar-se no pensamento do feitor, que todo absorvido nos seus projetos<br />

<strong>de</strong> surpreen<strong>de</strong>r os imaginados amores <strong>de</strong> <strong>Coqueiro</strong> e uma das filhas <strong>de</strong> Francisco<br />

Benedito, talvez a Mariquinhas, nem sequer reparara que a zelosa Carolina já não o<br />

visitava mais.<br />

Durante todos esses dias Manuel João não se tinha encontrado com os seus<br />

companheiros e nem podia atinar com a empresa a que tinha ido o violeiro.<br />

Também a sua preocupação especial era vigiar estreitamente os passos do<br />

amo e os das filhas <strong>de</strong> Francisco Benedito.<br />

Como o jacaré, no tempo do choco, vai colocar-se a alguma distância, e <strong>de</strong><br />

lá, olhos atentamente fixos, <strong>ou</strong>vidos solicitamente prestados, todos os sentidos,<br />

enfim, aguçadamente aplicados, vigia o ninho <strong>de</strong> on<strong>de</strong> há <strong>de</strong> nascer-lhe a prole, e ao<br />

menor estremecimento, ao menor ruído aco<strong>de</strong> pronto como um ralo, feroz como uma<br />

45

Hooray! Your file is uploaded and ready to be published.

Saved successfully!

Ooh no, something went wrong!