Somos Semeadores: estratégias identitárias na Escola Normal Sarah
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senhor clérigo é muito bom... é uma coisa muito séria... ganha-se muito... pode vir<br />
um dia a ser cura. Está dito, há de ser clérigo... ora, se há de ser; hei de ter ainda o<br />
gostinho de o ver dizer missa... de o ver pregar <strong>na</strong> Sé, e então hei de mostrar a toda<br />
esta gentalha aqui da vizinhança que não gosta dele que eu tinha muita razão em lhe<br />
querer bem. Ele está ainda muito pequeno, mas vou tratar de o ir desas<strong>na</strong>ndo aqui<br />
mesmo em casa, e quando tiver 12 ou 14 anos há de me entrar para a escola.” 19<br />
Vejamos que a perso<strong>na</strong>gem não ape<strong>na</strong>s tem como um tanto obscuro o “proveito” que<br />
seu protegido possa ter com a educação, como também considera como idade indicada para<br />
o ingresso escolar os “12 ou 14 anos” . Antes disso ele mesmo se propunha a alfabetizar a<br />
criança, já que não reconhecia competência específica nessa tarefa que, a seu ver, podia ser<br />
realizada por qualquer letrado.<br />
Outro exemplo, apontado por essa autora, do perfil identitário do docente nesta época<br />
pode ser entrevisto, em 1864, <strong>na</strong> declaração do inspetor-geral da Instrução Pública da<br />
província de São Paulo:<br />
Os concursos de ordinário consistem num exame quase sem publicidade; ninguém<br />
comparece a presenciá-los; o candidato não tem já mais competidor, propõe-se a<br />
contender por um lugar que ninguém lhe disputa,. Em regra ele lê correntemente,<br />
escreve com maior ou menor apuro caligráfico, efetua as quatro operações<br />
fundamentais da aritmética, às vezes com dificuldade e alguns erros; a parte teórica<br />
não é devidamente aprofundada. Em Religião, recita de cor as orações principais da<br />
Igreja; responde a uma ou outra pergunta, sem contudo dar provas de que<br />
cabalmente compreende os princípios e a doutri<strong>na</strong>.(TANURI, 2000, p. 65). 20<br />
Nas três últimas décadas daquele século transformações de ordem política e social,<br />
permitiram que lentamente fosse forjada uma nova identidade para os docentes brasileiros. A<br />
partir de então, o professor primário passaria a ter uma nova visibilidade <strong>na</strong> sociedade,<br />
podemos dizer que passaria a ser valorizado. Não podemos deixar de nos fasci<strong>na</strong>r com este<br />
processo. Pois, como veremos, a valorização do docente se escora em noções no mínimo<br />
curiosas; sacrifício, pobreza, austeridade, sacerdócio e missão.<br />
O Brasil do fi<strong>na</strong>l do século XIX passava, com efeito, por inúmeras mudanças:<br />
enfraqueceu-se o poder dos Conservadores e da própria mo<strong>na</strong>rquia, mi<strong>na</strong>do pelo avanço do<br />
que Villela (2003) chamou de “montante liberal”. O movimento abolicionista também ganhou<br />
19 Extraído do endereço eletrônico<br />
http://pt.wikisource.org/w/index.php?title=Mem%C3%B3rias_de_um_Sargento_de_Mil%C3%ADcias/III&oldi<br />
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