O Globo, 05/11/1954 - Geia Plural
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informações, foram quase todos os que não conseguiram entrar na quadrilha) se<br />
derramaram depois cá por fora em mil várias conjecturas sobre a genuína causa<br />
dele, sendo que, dos meus confrades folhetinistas, uns o atribuem à falta de juízo,<br />
e outros a gosto mau e pior. Nada disso: a razão de todas estas aéreas chocalhices,<br />
é que poucos escrevem a história com o critério e sisudez que ela requer, e Tímon<br />
usa. É o caso. Estará o respeitável público lembrado que, a pedido meu, e para<br />
a vindoura festa dos Remédios, 42 encomendou ao Sr. Comendador Porto para o<br />
Oriente o famoso corno de Oberon; 43 entretanto havia todo mundo, engolfado nas<br />
distrações e susto da atualidade, perdido inteiramente de vista este im-portante<br />
negócio, mas o Sr. Gamboa, que não deixa passar contrabando ou camarão pela<br />
malha, e que, para não ser abelhudo, já levou para o seu tabaco, confiou-me debaixo<br />
de segredo que a encomenda veio no iate do príncipe Labanoff, em um rico estojo,<br />
e dentro de um baú de Moscóvia dos mais ordinários, para não desafiar suspeitas.<br />
Parece que na lida e barafunda dos últimos aprestos do Teatro, um dos triúnviros<br />
(não farei ao publico a injúria de supor que seja necessário nomear-lho para que o<br />
conheça) o esqueceu ali por acaso; e eis senão quando, tendo de tocar a banda de<br />
música dos Educandos 44 naquele intervalo, um dos meninos, descuidado e sem<br />
malícia, em vez do seu, embocou aquele inu-sitado instrumento. Agora o verão:<br />
salta o califa com toda a sua corte para o meio da sala, e saltam com ele, como<br />
tocados de súbita vertigem,<br />
Velhos e moços, donas e donzelas, 45<br />
42 A festa dos Remédios acontecia todos os anos, em outubro, no largo frontal à igreja do mesmo nome, hoje Praça Gon-çalves<br />
Dias. A seu respeito, João Lisboa escreveu (15.out.1851) um folhetim em que a descreve “a mais popular desta boa cidade de São<br />
Luís”. (Ver Obras, 4º v. 3. ed. São Luís: Alumar, 1991, p. 307-25).<br />
43 O famoso corno de Oberon: João Lisboa escreveu no folhetim A Festa de Nossa Senhora dos Remédios: “Sr. Comendador<br />
Porto, meu senhor, mande vir, por quem é, o corno de Oberon para a festa do ano que vem, e não olhe para despesa, pois se for<br />
indispensável, fico que a Assembleia Provincial vote uma prestação condigna a tão importante melhoramento...” (Obras, v. cit.,<br />
p. 324-25). A personagem Oberon vem de uma longa tradição de canções de gesta medievais e foi aproveitada por vários autores,<br />
entre eles os dramaturgos Shakespeare e Wieland (mencionado mais à frente neste texto) e o músico Carl Maria von Weber.<br />
O corno (fagote) de Oberon tinha o condão mágico, quando soado, de transportar pessoas para lugares distantes.<br />
44 A banda...: da Casa dos Educandos Artífices, instituição criada pelo governo da Província do Maranhão pela lei nº 1<strong>05</strong>, de<br />
23.ago.1841, para a educação profissional de meninos pobres.<br />
45 Velhos e moços...: verso d’Os lusíadas (Canto VII, 49) de Camões.<br />
Índice<br />
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