Prosa - Academia Brasileira de Letras
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Eucli<strong>de</strong>sdaCunhaeopensamentosocialnoBrasil<br />
À semelhança <strong>de</strong> outros autores, Eucli<strong>de</strong>s da Cunha refletiu sobre os dois<br />
temas que marcaram a produção intelectual durante o século XIX: <strong>de</strong> que<br />
modo organizar o novo Estado e como organizar politicamente a socieda<strong>de</strong><br />
que se formava (Santos, 2002). Foi neste texto que Eucli<strong>de</strong>s observou a precedência<br />
do Estado sobre a organização da socieda<strong>de</strong> como uma das principais<br />
características <strong>de</strong> nossa formação histórica, afirmando ser o Brasil uma nacionalida<strong>de</strong><br />
criada por uma teoria política.<br />
Nele também está presente a célebre imagem da dualida<strong>de</strong> básica da socieda<strong>de</strong><br />
brasileira: um Brasil do litoral, um Brasil dos sertões. No artigo em pauta,<br />
atribuiria a esse fato a explicação para alguns conflitos regionais durante o<br />
Império, como foi o caso da Cabanagem, uma espécie <strong>de</strong> prefiguração do que<br />
ocorreria em Canudos:<br />
“Simbolizava o repontar da questão mais séria, que passou <strong>de</strong>spercebida<br />
à sua visão aguda, e se <strong>de</strong>stinava a permanecer na sombra até nossos dias.<br />
[...] Era o crescente <strong>de</strong>sequilíbrio entre os homens do sertão e os do litoral.<br />
O raio civilizador refrangia na costa. Deixava na penumbra os planaltos. O<br />
maciço <strong>de</strong> continente compacto e vasto talhava uma fisionomia dupla à nacionalida<strong>de</strong><br />
nascente [...]. Ao ‘cabano’ se ajuntariam com o correr do tempo<br />
o ‘balaio’ no Maranhão, o ‘chimango’ no Ceará, o ‘cangaceiro’ em Pernambuco,<br />
nomes diversos <strong>de</strong> uma diátese social única, que chegaria até hoje,<br />
projetando nos <strong>de</strong>slumbramentos da República a silhouette trágica do jagunço”.<br />
(Cunha b, 1966, p. 351).<br />
Este contraste entre litoral e sertão – ora tensão entre civilização e barbárie,<br />
ora entre elementos alheios, cópia <strong>de</strong> outras civilizações, e os elementos<br />
virtualmente constitutivos <strong>de</strong> uma autêntica nacionalida<strong>de</strong> – está presente<br />
em ambos os textos e remete-nos ao <strong>de</strong>bate sobre a i<strong>de</strong>ia do contraste tipológico<br />
entre duas or<strong>de</strong>ns sociais proposto por Robert Nisbet (1980) em sua<br />
análise sobre o surgimento dos argumentos sociológicos na Europa. Nisbet<br />
afirma que foram os conservadores, no âmbito <strong>de</strong> uma disputa entre diferen-<br />
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