Prosa - Academia Brasileira de Letras
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Gilberto <strong>de</strong> Mello Kujawski<br />
Joaquim Maria foi um carioca da gema, sem o ranço <strong>de</strong> misantropia que lhe atribuem,<br />
divertindo-se com o ritmo buliçoso das ruas, amante <strong>de</strong> bailes, reuniões e teatros,<br />
e animado sempre por aquele traço <strong>de</strong> humorismo próprio do carioca típico.<br />
O romance e o conto submetem-se facilmente aos dogmas e idiossincrasias<br />
das escolas literárias vigentes, o Romantismo, o Realismo, o Naturalismo, etc.<br />
A crônica, talvez por ser consi<strong>de</strong>rada um gênero menor, escapa à regimentação<br />
inflexível ditada pelas escolas. Na crônica fala o autor mesmo, a partir <strong>de</strong> sua<br />
autenticida<strong>de</strong>, <strong>de</strong> sua liberda<strong>de</strong> interior, liberta do formalismo e do dogmatismo<br />
dos sistemas, das doutrinas e das tendências estilísticas dominantes.<br />
Ao iniciar sua carreira <strong>de</strong> cronista nos jornais, Machado se refere àquele<br />
“pico e sabor que são a alma da crônica” (Notas Semanais, 1878). Pico, isto é,<br />
chiste, graça, malícia. No mesmo ano promete intercalar na crônica, ainda tratando<br />
<strong>de</strong> coisas sérias, “o ar brincalhão e galhofeiro” próprio do folhetim<br />
(O.C., III, 384). Ou seja, o autor <strong>de</strong> Brás Cubas adota em seu trabalho <strong>de</strong> cronista<br />
o humorismo formalmente <strong>de</strong>liberado, propositado, procurado. Note-se<br />
bem, o humorismo pelo humorismo, sem aci<strong>de</strong>z, sem o veneno do pessimismo,<br />
<strong>de</strong>scontraído, simplesmente divertido, como quer ser o humorismo carioca.<br />
Na crônica, Machado se liberta <strong>de</strong> si mesmo, daquela imagem do autor<br />
distante, situado em plano superior e avaliando os dramas da existência<br />
como comédia e nada mais. Volta a ser o Machadinho que perambulava<br />
pelas ruas à procura do seu segundo amor em todas as formas, figuras, cenas<br />
e ritmos da cida<strong>de</strong> do Rio <strong>de</strong> Janeiro.<br />
Passeando pelo Rio<br />
A primeira obrigação do cronista urbano é passear pela cida<strong>de</strong>, bater<br />
perna <strong>de</strong> manhã, à tar<strong>de</strong> e à noite pelas ruas, vielas, praças, bairros, logradouros<br />
diversos que guardam os segredos e o espírito dos lugares, como fazia<br />
Machado:<br />
“É meu costume, quando não tenho o que fazer em casa, ir por esse mundo<br />
<strong>de</strong> Cristo, se assim se po<strong>de</strong> chamar à cida<strong>de</strong> <strong>de</strong> São Sebastião, matar o<br />
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