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Prosa - Academia Brasileira de Letras

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Gilberto Mendonça Teles<br />

JOÃO CABRAL DE MELO NETO se tornará, sem dúvida, a mais importante expressão<br />

dos problemas humanos do sertão nor<strong>de</strong>stino. Em ORio(1954) encontra-se<br />

uma “Notícia do Alto Sertão” que significa “terra <strong>de</strong>sertada,/ vaziada,<br />

não vazia,/ mais que seca, calcinada”. Em nove dos seus livros há imagens em<br />

torno da palavra sertão: “na folha plana/ do Sertão”, o “Sertão <strong>de</strong>sapropria”, “o<br />

Sertão coletivista”, o “Sertão masculino”, “eriçado” e <strong>de</strong> “alma bruta”. Em A<br />

Educação pela Pedra (1966) o “Alto Sertão” é o lugar da seca, on<strong>de</strong> os rios são “interinos”<br />

e “a pedra não sabe lecionar”. Mas o livro <strong>de</strong> João Cabral que mais o<br />

cita é A Escola das Facas (1980), on<strong>de</strong> se reúnem todas as significações nor<strong>de</strong>stinas<br />

da lexia sertão: Nor<strong>de</strong>ste interior, seca, retirante, lugar duro e difícil, cuja geografia<br />

levou o poeta à comparação insistente com Sevilha. Há aí imagens como a do<br />

“trampolim que quando/ mais o Sertão se seca,/ nos joga retirantes,/ a pé, sem<br />

pára-quedas”. O ponto <strong>de</strong> vista é do litoral, no entanto a linguagem funda o ser e<br />

outro sertão muito mais real: a “lixa do Sertão”, “o osso do Sertão”.<br />

Esta simples <strong>de</strong>scrição do percurso da palavra sertão na poesia brasileira levou<br />

em consi<strong>de</strong>ração, inicialmente, o lado obscuro <strong>de</strong> sua etimologia e o significado<br />

com que ela entrou na nossa cultura, on<strong>de</strong> se <strong>de</strong>senvolveu com os novos<br />

horizontes das entradas e ban<strong>de</strong>iras e com a formação <strong>de</strong> uma consciência nacional.<br />

E levou em conta a mudança da i<strong>de</strong>ologia colonizadora na expressão<br />

do imaginário brasileiro, em que o lugar do sertão se foi <strong>de</strong>ixando assinalar pela<br />

sua poesia, por um luar, um sentido <strong>de</strong> luz coada pela atmosfera escaldante, <strong>de</strong><br />

sobra, <strong>de</strong> riqueza e miséria, <strong>de</strong> produção e exploração do homem que habita os<br />

gran<strong>de</strong>s espaços do interior ou dos sertões nalgumas das regiões brasileiras.<br />

3.OEntrelugardosHistoriadores<br />

Já se po<strong>de</strong> dizer que faz um século que a obra-prima <strong>de</strong> EUCLIDES DA<br />

CUNHA, Os Sertões (1902), vem repercutindo no leitor brasileiro (e às vezes no<br />

leitor estrangeiro), em todo tipo <strong>de</strong> leitor: no erudito – geógrafo, antropólogo,<br />

sociólogo, político, professor, escritor, intelectual <strong>de</strong> toda espécie – e no leitor<br />

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