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Prosa - Academia Brasileira de Letras

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Em torno do Juca Mulato<br />

ocorrências <strong>de</strong> apossínclise, fato sintático por certo incomum nos falares do<br />

português do Brasil: “era como se o não visse” e “Antes era eu que a não via”.<br />

No diálogo que trava com o feiticeiro (“A Mandinga”, I, verso 11), é evi<strong>de</strong>nte<br />

a fuga ao populismo pronominal: “você me vai dar um remédio”, em vez<br />

do corrente (já hoje com foros <strong>de</strong> literarieda<strong>de</strong>) “vai me dar”. (Verda<strong>de</strong> que<br />

po<strong>de</strong>ria dizer “vai-me dar”...). Em contrapartida, na parte final (“Ressurreição”,<br />

II, verso 2), evita nitidamente a tmese, escrevendo “o po<strong>de</strong>ria pôr”,<br />

quando a vírgula que antece<strong>de</strong> o sintagma sugeriria, talvez, “podê-lo-ia pôr”.<br />

Destoando da geral correção <strong>de</strong> linguagem, a pontuação <strong>de</strong> Menotti, neste poema,<br />

está longe <strong>de</strong> ser canônica. Na maioria dos casos, é razoável supor distração.<br />

Métrica<br />

Merecem nota alguns inci<strong>de</strong>ntes métricos.<br />

O verso utilizado é, quase sempre, o alexandrino <strong>de</strong> cesura medial ou o trimembre.<br />

Surge isolado, entretanto, um do<strong>de</strong>cassílabo atípico no início <strong>de</strong> “A<br />

Voz das Coisas”: “E a torrente que ia rolar para o abismo”.<br />

Antes (em “Germinal”, V, verso 18) já observáramos uma quebra por excesso:<br />

“como o sol que traz a luz e, <strong>de</strong>pois, <strong>de</strong>ixa a sombra”, on<strong>de</strong>, ao que parece,<br />

distraidamente se encosta o artigo à palavra luz.<br />

Também parece distração (“Germinal”, II, v. 8) o singular “<strong>de</strong>sejo” em<br />

“tem <strong>de</strong>sejo até <strong>de</strong> rebrotar raízes”. Há, contudo, se bem que menos gritantes,<br />

outros hiatos na sequência dos versos: “Aflora-lhe no imo um sonho que braceja”;<br />

“o aré como um bafo, a água corrente, um pranto” (“Germinal”, IV, 1 e<br />

23); “Eu, da luz do olhar garço” (“Lamentações”, V, 31); “– Roque, eu mesmo<br />

não sei se este mal tem cura” (“A Mandinga”, I, 23).<br />

Em sentido contrário, algumas sinéreses: “etíope” (“Germinal”, II, antepenúltima<br />

linha); “veem” (“A Serenata”, 4.ª quadra, v. 1: “Os céus não veem tua<br />

mágoa”; po<strong>de</strong>-se ler, alternativamente, com sinérese em “tua”); “E fica incerta,<br />

ao ouvir-te a voz, a dor da gente” (“Lamentações”, III, 3); “canoa” (“Lamentações”,<br />

IV, 8); “caem-te” (“Ressurreição”, I, 7).<br />

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