Prosa - Academia Brasileira de Letras
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Arnaldo Niskier<br />
Esta tornar-se-á objetiva nas peças Lampião (1953) e A Beata Maria do Egito<br />
(1958), on<strong>de</strong> os temas são o cangaço e o fanatismo. Assim como no romance,<br />
na essência das peças é a personagem feminina que <strong>de</strong>termina a ação. A inquirição<br />
psicológica, movida pela visão <strong>de</strong> mundo feminina, situa a mulher nor<strong>de</strong>stina<br />
frente aos três temas constantes <strong>de</strong> Rachel: a seca, o cangaço e o<br />
fanatismo.<br />
A mulher sertaneja, na ficção <strong>de</strong> Rachel <strong>de</strong> Queiroz, não se isola individualmente;<br />
ao contrário, integra-se nos próprios dramas regionais. Os dramas<br />
crescem porque ela está presente, <strong>de</strong>les participa, anima-os <strong>de</strong> paixão.<br />
O teatro brasileiro, diferentemente do que se verificou com o romance e a<br />
poesia nas décadas <strong>de</strong> 20 e 30, só na década <strong>de</strong> 50 e <strong>de</strong>pois participaria da<br />
eclosão mo<strong>de</strong>rnista revolucionária. Também aqui, Rachel <strong>de</strong> Queiroz muito<br />
concorreu para isso. No seu teatro, o nativismo regional surgiu como um espaço<br />
capaz <strong>de</strong> exprimir o drama. A peça Lampião trouxe para a dramaturgia o<br />
tema do cangaço e o tipo social do cangaceiro, assim como A Beata Maria do Egito<br />
trouxe o tema do fanatismo religioso como matéria <strong>de</strong> valida<strong>de</strong> artística,<br />
abrindo <strong>de</strong> fato a nova perspectiva que peças posteriores, <strong>de</strong> Ariano Suassuna e<br />
Dias Gomes, entre outros, viriam consolidar.<br />
Excluindo OGalo<strong>de</strong>Ouro, romance aparecido sob forma <strong>de</strong> folhetim em<br />
OCruzeiro, Rachel voltou ao romance bem mais tar<strong>de</strong>, no início da década<br />
<strong>de</strong> 70, com Dôra, Doralina, após longa interrupção. Também este romance<br />
tem na criatura humana <strong>de</strong> todos os dias a própria razão <strong>de</strong> ser da ficção.<br />
Nele predomina a veracida<strong>de</strong>, a <strong>de</strong>scrição física <strong>de</strong> cenários e ambientes,<br />
além da caracterização das personagens como se fossem gente <strong>de</strong> registro<br />
civil. O exemplo maior é a própria Dôra, ou Doralina, vivendo, amando,<br />
sofrendo, como personagem e como símbolo e imagem da própria condição<br />
humana.<br />
Segundo o ensaísta Haroldo Bruno,<br />
“esse romance contém, por baixo do seu elevado nível <strong>de</strong> realização, tais<br />
premissas criadoras, tal leque <strong>de</strong> possibilida<strong>de</strong>s inesperadas, força tão gran-<br />
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