Prosa - Academia Brasileira de Letras
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Gilberto Mendonça Teles<br />
todos estes <strong>de</strong> uma só lingua ainda que em algumas palavras discrepão e esta<br />
é a que enten<strong>de</strong>m os Portuguezes; é facil, e elegante, e suave, e copiosa, a difficulda<strong>de</strong><br />
<strong>de</strong>lla está em ter muitas composições: porém dos Portuguezes,<br />
quasi todos os que vêm do Reino e estão cá <strong>de</strong> assento e communicação<br />
com os Indios a sabem em breve tempo, e os filhos dos Portuguezes cá nascidos<br />
a sabem melhor que os Portuguezes, assim homens como mulheres,<br />
principalmente na Capitania <strong>de</strong> São Vicente, e com estas <strong>de</strong>z nações <strong>de</strong><br />
Indios têm os Padres communicação por lhes saberem a lingua, e serem<br />
mais domesticos e bem inclinados: estes forão e são os amigos antigos dos<br />
Portuguezes, com cuja ajuda e armas, conquistarão esta terra, pelejando<br />
contra seus proprios parentes, e outras diversas nações barbaras e rão tantos<br />
os <strong>de</strong>sta casta que parecia impossivel po<strong>de</strong>rem-se extinguir, porem os Portuguezes<br />
lhes têm dado tal pressa [sic] que quasi todos são mortos e lhes têm<br />
tal medo, que <strong>de</strong>spovoão a costa e fogem pelo sertão a <strong>de</strong>ntro até trezentas<br />
a quatrocentas leguas” [p. 194-5].<br />
É uma citação bastante longa, mas realmente importante pelo número <strong>de</strong><br />
informações sobre o habitat dos índios no século XVI e, principalmente, pelo<br />
processo gradual <strong>de</strong> extinção <strong>de</strong> que foram vítimas pelos colonizadores portugueses.<br />
FREI VICENTE DO SALVADOR, o nosso primeiro historiador [a sua História<br />
do Brasil é <strong>de</strong> 1627], várias vezes menciona o sertão, fixando-lhe <strong>de</strong>finitivamente<br />
o sentido <strong>de</strong> terras <strong>de</strong> <strong>de</strong>ntro do país, em oposição às terras “<strong>de</strong> fora”, isto é, as<br />
que se esten<strong>de</strong>m pela costa brasileira. As suas imagens ficaram famosas como<br />
aquela <strong>de</strong> que o Brasil tem a “figura <strong>de</strong> uma harpa” ou a <strong>de</strong> comparar os portugueses<br />
com os caranguejos:<br />
“Da largura que a terra do Brasil tem para osertãonão trato, porque<br />
até agora não houve quem a andasse por negligência dos portugueses,<br />
que, sendo gran<strong>de</strong>s conquistadores <strong>de</strong> terras, não se aproveitam <strong>de</strong>las,<br />
mas contentam-se <strong>de</strong> as andar arranhando ao longo do mar como caranguejos”<br />
[p. 59].<br />
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