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Relatório Final - A verdade sobre a escravidão negra - Comissão da Verdade

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Todos <strong>da</strong> grande família quilombola assinam Jacinto de<br />

Souza. Dos patriarcas, vive apenas o “tio Zé, já doente e um pouco<br />

esquecido <strong>da</strong>s coisas”. Maria de Fátima relata que as pessoas mais<br />

velhas, como ele que reside em Apareci<strong>da</strong> de Goiânia/GO, ain<strong>da</strong><br />

recor<strong>da</strong>m alguns detalhes do período pós-<strong>escravidão</strong>. Mas o<br />

relato de Fátima é marcado pela festivi<strong>da</strong>de do povo negro que<br />

apresentou à Comissão cantando um trecho <strong>da</strong> música que os<br />

quilombolas cantavam na Festa do dia 13 de Maio:<br />

“Salve a princesa Isabel. Deu liber<strong>da</strong>de a cor.<br />

Foi no dia treze de maio, preto não é mais lacaio, preto não<br />

tem mais senhor.<br />

Desde o dia que a princesa assinou a Lei Áurea <strong>da</strong> Abolição,<br />

hoje pode ser um ci<strong>da</strong>dão, deputado e senador.<br />

Hoje o preto pode ser doutor e não há mais preconceito de cor.<br />

Liber<strong>da</strong>de, liber<strong>da</strong>de, abre as asas <strong>sobre</strong> nós.<br />

Liber<strong>da</strong>de, liber<strong>da</strong>de, abre as asas <strong>sobre</strong> nós”.<br />

(Trecho <strong>da</strong> música canta<strong>da</strong> na Festa do dia 13 de Maio)<br />

Uma <strong>da</strong>s grandes características do kilombo urbano é a<br />

miscigenação e a interculturali<strong>da</strong>de que, por força do convívio<br />

confuso, ofusca e oprime a identi<strong>da</strong>de do negro. Lucy Helena Roza<br />

Tavares (presidenta <strong>da</strong> Associação Quilombola Ana Laura) destaca<br />

um breve resumo do que representa sua genealogia. Sua bisavó<br />

paterna foi uma senhora <strong>negra</strong> que viveu em senzalas e que se<br />

destacava na cozinha e na voz. Essa matriarca teve muitos filhos,<br />

porém ca<strong>da</strong> um desses filhos teve um pai diferente. Muitos deles<br />

tiveram por pai algum dos filhos dos patrões: “hoje, aqui na ci<strong>da</strong>de<br />

os parentes do meu pai são completamente diferentes um do outro”,<br />

afirma a liderança.<br />

Já o avô de Lucy, Gil Francisco <strong>da</strong> Rosa, destacou-se entre as<br />

pessoas do seu tempo, foi um dos poucos que aprendeu a ler e<br />

a escrever pois, os patrões envelheciam e precisavam de pessoas<br />

que pudessem sair para a ci<strong>da</strong>de com o objetivo de resolver as<br />

deman<strong>da</strong>s financeiras. As instruções básicas de alfabetização eram<br />

passa<strong>da</strong>s a Gil pelos filhos de seus patrões.<br />

O início foi difícil, pois além de se dedicar aos estudos, Gil<br />

plantava e colhia nas lavouras o sustento de seus quatorze filhos.<br />

Devido às dificul<strong>da</strong>des, com o tempo entregou algumas <strong>da</strong>s<br />

crianças aos cui<strong>da</strong>dos dos padrinhos, dentre os quais Humberto<br />

Pires Rosa, pai <strong>da</strong> Lucy. A vi<strong>da</strong> de Gil foi marca<strong>da</strong> por infortúnios,<br />

mesmo assim, por sua dedicação alcançou cargo cuja competência<br />

era coletar impostos estaduais no município. Já a infância de<br />

Humberto foi marca<strong>da</strong> pela sau<strong>da</strong>de dos irmãos, pela pressão que<br />

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