Relatório Final - A verdade sobre a escravidão negra - Comissão da Verdade
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Porém, <strong>sobre</strong>tudo nesse meio rural, continuam significativas as<br />
dispari<strong>da</strong>des de gênero. Apesar do maior número de mulheres nos Kilombos<br />
e dessas serem, na maioria dos casos, suas representantes legais, as vozes dos<br />
homens ain<strong>da</strong> pesam <strong>sobre</strong>maneira em algumas decisões. Quanto a estes<br />
posicionamentos e interferências, as quilombolas líderes de comuni<strong>da</strong>des<br />
alertaram recentemente, por meio de uma carta <strong>da</strong> Secretaria de Mulheres<br />
Quilombolas, vincula<strong>da</strong> à Conaq, durante a 5ª Marcha <strong>da</strong>s Margari<strong>da</strong>s em<br />
2016, o seguinte:<br />
[...]Por meio <strong>da</strong> Marcha ressaltamos questões que julgamos<br />
relevantes de serem aprofun<strong>da</strong><strong>da</strong>s pela socie<strong>da</strong>de. Por<br />
exemplo, as dispari<strong>da</strong>des sociais entre homens e mulheres e<br />
entre mulheres <strong>negra</strong>s e não <strong>negra</strong>s. Em linhas gerais to<strong>da</strong>s<br />
as mulheres <strong>negra</strong>s correspondemos nos <strong>da</strong>dos de violência<br />
doméstica, segurança pública e mortali<strong>da</strong>de, aos mais altos<br />
índices enquanto vítimas. Em nossas buscas por proteção,<br />
auxílio ou orientação somos mais uma vez expostas, dessa vez<br />
ao que é hoje conhecido como racismo institucional.<br />
Nos territórios quilombolas sofremos também com os<br />
conflitos agrários, apesar de to<strong>da</strong>s as formas de preconceito já<br />
estabeleci<strong>da</strong>s estamos ain<strong>da</strong> mais vulneráveis devido às lutas<br />
enfrenta<strong>da</strong>s em defesa de nosso espaço ancestral. Estamos<br />
cansa<strong>da</strong>s, nós e nossas famílias, de sermos criminaliza<strong>da</strong>s pela<br />
posse <strong>da</strong>s terras que her<strong>da</strong>mos, quando sequer são lembrados<br />
o que nos foi tirado a partir <strong>da</strong> escravização.<br />
Contudo, nos adequamos a esta terra chama<strong>da</strong> Brasil e pelo<br />
amor que aprendemos a dedicar somos hoje considera<strong>da</strong>s<br />
nativiza<strong>da</strong>s deste país. Aqui, tivemos filhos, netos, bisnetos.<br />
Estamos nas quarta, quinta e até sexta gerações, contribuindo<br />
para o desenvolvimento de uma socie<strong>da</strong>de <strong>da</strong> qual<br />
somos co-fun<strong>da</strong>doras e nossa luta contemporânea é por<br />
reconhecimento, por ci<strong>da</strong><strong>da</strong>nia e por respeito às nossas vi<strong>da</strong>s<br />
[...]<br />
A invisibili<strong>da</strong>de <strong>da</strong><strong>da</strong> às mulheres interfere no próprio desenvolvimento<br />
dos Kilombos. Um tema de debate entre quilombolas se refere ao modo<br />
como, mesmo dentro <strong>da</strong>s associações, por vezes os homens surgem como<br />
lideranças, pelo simples fato de estarem na ponta <strong>da</strong>s negociações, quando<br />
quem toca as produções são as mulheres. Há casos onde são elas que plantam<br />
as hortas, produzem os alimentos tradicionais, se reúnem para os debates e<br />
encaminhamentos comunitários, porém os homens são reconhecidos como<br />
líderes por serem a face conheci<strong>da</strong> <strong>da</strong>s comuni<strong>da</strong>des, os vendedores desses<br />
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