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MIOLO ELA POR ELAS Nº 8

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121<br />

“… As oito e meia da noite<br />

eu ja estava na favela<br />

respirando o odor dos<br />

excrementos que mescla<br />

com o barro podre. Quando<br />

estou na cidade tenho a<br />

impressão que estou na<br />

sala de visita com seus<br />

lustres de cristais, seus<br />

tapetes de viludos,<br />

almofadas de sitim. E<br />

quando estou na favela<br />

tenha a impressão que sou<br />

um objeto fora do uso,<br />

digno de estar num quarto<br />

de despejo”. (Quarto de<br />

Despejo, 2007, p.38).<br />

"O livro... me fascina.<br />

Eu fui criada no mundo.<br />

Sem orientação materna.<br />

Mas os livros guiou os meus<br />

pensamentos. Evitando os<br />

abismos que encontramos<br />

na vida. Bendita as horas<br />

que passei lendo. Cheguei a<br />

conclusão que é o pobre<br />

quem deve ler. Porque o<br />

livro, é a bussola que ha de<br />

orientar o homem no porvir<br />

(...)" (Meu estranho diário,<br />

1996, p. 167).<br />

"O homem que cultiva o ódio<br />

racial é um imbecil" – (Provérbios.<br />

São Paulo: Editor Áquila,<br />

1963).<br />

Trechos de obras da escritora<br />

Carolina de Jesus<br />

Comentários<br />

críticos sobre obras<br />

de Carolina<br />

Fugindo aos cânones do que se considera<br />

“literatura” em meios acadêmicos,<br />

Quarto de Despejo é mais do que um<br />

simples depoimento; trata-se de uma<br />

obra em que, a despeito das condições<br />

materiais e culturais de sua autora, constrói-se<br />

uma forte e única representação<br />

da dinâmica social urbana, vista pelo<br />

ângulo dos que são lançados à margem.<br />

Carolina Maria de Jesus escreve para<br />

denunciar a favela e para sair dela; escreve<br />

também para, diferenciando-se<br />

dos outros moradores, lutar contra o<br />

rebaixamento a que estão sujeitos os<br />

miseráveis, num momento em que se<br />

anuncia novo salto modernizador de<br />

São Paulo e do Brasil.<br />

Em Casa de Alvenaria, notam-se<br />

mais explicitamente as contradições da<br />

autora quanto ao que deseja para si<br />

mesma e para sua família. Também<br />

ficam patentes suas hesitações com relação<br />

aos anseios por reconhecimento<br />

público ou ao repúdio pelos mecanismos<br />

sociais que dificultam o trajeto<br />

profissional como escritora. Essa conjunção,<br />

por vezes discrepante, ajuda a<br />

entender as razões pelas quais essa<br />

obra é considerada pouco significativa<br />

e muito voltada para o trajeto instável<br />

de um indivíduo. Confinada à forma do<br />

diário, Carolina Maria de Jesus parece<br />

se sentir compelida a repetir uma fórmula,<br />

cujo efeito não tem a força de revelação<br />

de Quarto de Despejo. A<br />

figura da ex-favelada não desperta interesse,<br />

porque ela e sua obra são objeto<br />

de atenção apenas enquanto<br />

revelam a face negativa do desenvolvimentismo;<br />

já as oscilações ideológicas<br />

da mulher que, famosa, busca a atenção<br />

da imprensa e do público não trazem<br />

à época elementos que se julguem<br />

significativos.<br />

Diário de Bitita, publicado após<br />

a morte da autora, resgata a força literária<br />

da produção de Carolina Maria<br />

de Jesus. Trata-se de memórias da infância<br />

e da adolescência, em Sacramento<br />

e nas fazendas onde trabalha<br />

como colona, bem como de seus primeiros<br />

tempos em Franca. Nesta obra,<br />

os temas da injustiça social, da opressão,<br />

do preconceito contra os negros, dos<br />

abusos dos poderosos são apresentados<br />

a partir da perspectiva daquela que os<br />

viveu. Apesar de suas condições materiais,<br />

Carolina Maria de Jesus lutou<br />

para conquistar dignidade e para se<br />

constituir como alguém que resiste à<br />

exploração e à desumanização. A obra<br />

testemunha a história dessa luta e da<br />

opressão a que estão confinados os<br />

pobres no Brasil das primeiras cinco<br />

décadas do século XX.ø<br />

Fonte: Enciclopédia de Literatura/Itau Cultural,<br />

citado por FENSKE, Elfi Kürten (pesquisa, seleção<br />

e organização). Carolina Maria de Jesus - a voz<br />

dos não têm a palavra. Templo Cultural Delfos,<br />

maio/2014. Disponível no link. http://www.elfikurten.com.br/2014/05/carolina-maria-de-jesus.html<br />

(acessado em 6/02/2015).<br />

Revista Elas por Elas - Abril 2015

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