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JANSENISMO FRANCÊS NUM CÓDICE DA BIBLIOTECA NACIONAL DE PORTUGAL<br />

nos dá da liberdade da vontade hé perfeitamente a que nos dão os Philosophos e Padres Gregos. Mas<br />

então logo segundo essa explicação – Ser livre não hé outra coiza senão sêr voluntario e tudo o que<br />

hé voluntario hé livre?<br />

Filopista Sem duvida, se por voluntario se entende o que fazemos com hum perfeito conhecimento,<br />

pois que a vontade para nenh ~ ua outra coiza nos foi dada senão para querer o que (a) razão<br />

lhe propõe para querer.<br />

Teotimo. Eu comprehendo optimamente bem que tudo o que hé livre hé voluntario e que<br />

nada hé propriamente voluntario se não aquillo que se faz com conhecimento; e essa a razão por<br />

que as acções dos brutos, dos meninos, e dos loucos deixam de ser voluntarias ou exercitadas pella<br />

vontade, por isso mesmo que as fazem sem conhecimento do que fazem. Comprehendo tambem<br />

que para h ~ ua coiza ser voluntaria, não basta não ser constrangida; e que h ~ ua acção pode ser feita<br />

sem constrangimento e não ser voluntaria, como são as acções dos brutos e dos loucos, que obram<br />

sem violencia sim, mas sem razão. Mas o que ainda não posso nem sei perceber, hé de que modo<br />

tudo o que hé voluntario seja livre; pois que muitas acções da vontade vemos nós, que não obstante<br />

serem voluntarias, contudo se obrão necessariamente. Por exemplo, o amor com que Deus se ama e<br />

com que os Bemaventurados o amão hé um amor necessario; pois que Deus não pode não se amar;<br />

nem os Bemaventurados não amar a Deus. Ora concordai lá o necessário com o livre; e a liberdade<br />

com a necessidade.<br />

Filopista. Santo Agostinho distingue duas sortes de necessidade; h ~ ua quando a coiza acontece<br />

quer nós queiramos, quer não, como são a necessidade de morrer e os movimentos indeliberados<br />

que não dependem nem procedem da nossa vontade. A liberdade jamais se pode compadecer com<br />

esta necessidade. A outra hé quando a coiza se faz tão necessariamente que não pode deixar de se<br />

fazer, e contudo se faz, porque se quer fazer, como o amor com que Deus se ama e com que os Bemaventurados<br />

o amão. Deus ama-se porque quer amar-se, ainda que não possa deixar de se amar; os<br />

Bemaventurados amão a Deus, porque o querem amar, e querem-no tão fortemente que nunca<br />

podem deixar de o querer. Logo o que vos não deixa perceber de que modo h ~ ua acção seja livre,<br />

ainda que seja necessaria, hé a confusão que fazeis da necessidade de natureza, que hé quando alg ~ ua<br />

coiza se faz independentemente da vontade, com a necessidade da vontade, que hé quando alg ~ ua<br />

coiza se faz, porque se quer fazer, e se quer tão fortemente que nunca se pode deixar de querer.<br />

Teotimo. Supposta essa distinção comprehendo já sem difficuldade que só o que hé necessario<br />

por necessidade de natureza hé que não hé livre nem depende de nós, pois que nada depende de<br />

nós se não aquillo que nós fazemos, porque o queremos fazer: mas não assim aquellas coizas que<br />

são necessarias por necessidade chamada de vontade, pella qual nós as fazemos necessariamente<br />

porque queremos, ainda que não possamos deixar de querer; estas nunca deixam de ser livres. E<br />

como concebo claramente que esta neccessidade de vontade não destroe a liberdade, a qual consiste<br />

essencialmente no imperio que a nossa vontade tem sobre todas as suas acções, as quaes nunca existem<br />

senão porque ella quer e quando quer; também já para mim não hé difficultozo de comprehender<br />

que não repugna que h ~ ua acção seja livre, ainda quando necessaria; como claramente se vê no amor<br />

com que Deus se ama a si mesmo, e com que os Bemaventurados o amão. Este amor hé necessariamente<br />

livre, porque nasce da vontade que Deus tem de se amar, e nunca pode deixar de se amar,<br />

porque nunca pode deixar de querer amar-se. Hé também ao mesmo tempo necessario; porque<br />

nunca pode acontecer que Deus não queira amar-se ou os Bemaventurados amar a Deus. Porem<br />

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