Contornos do Indizível: o estilo de Clarice Lispector - Fale - UFMG
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Em Tese, Belo Horizonte, v. 10, p. 133-138, <strong>de</strong>z. 2006<br />
Fernan<strong>do</strong> Pessoa e Jacques Lacan: constelações, letra e livro<br />
Resumo<br />
Disponível em http://www.letras.ufmg.br/poslit<br />
Márcia Maria Rosa Vieira<br />
Este artigo colocou la<strong>do</strong> a la<strong>do</strong> a poética <strong>do</strong> escritor Fernan<strong>do</strong><br />
Pessoa, principalmente no seu Livro <strong>do</strong> <strong>de</strong>sassossego, e a teoria<br />
psicanalítica <strong>de</strong> Jacques Lacan, em especial aquela formulada<br />
nos anos 70, <strong>de</strong> mo<strong>do</strong> a examinar o “funcionamento constelar”<br />
e o “livro” como mo<strong>do</strong>s <strong>de</strong> dar forma ao acaso, à contingência.<br />
Palavras-chave: Constelações. Letra. Livro. Literatura. Psicanálise.<br />
Se cada escritor cria os seus precursores (BORGES, 1999, p. 88-90), se cada<br />
época cria os seus antepassa<strong>do</strong>s, não parece <strong>de</strong> to<strong>do</strong> <strong>de</strong>sproposita<strong>do</strong> incluir o escritor<br />
português Fernan<strong>do</strong> Pessoa entre os precursores da Literatura Comparada.<br />
Inegavelmente na poesia, e <strong>de</strong> algum mo<strong>do</strong> na prosa, ele <strong>de</strong>senvolve um autêntico<br />
exercício <strong>de</strong> comparativismo. Para localizá-lo, basta uma olha<strong>de</strong>la no índice das Obras<br />
em Prosa, on<strong>de</strong> se lê “Alberto Caeiro visto por Álvaro <strong>de</strong> Campos”, “Ricar<strong>do</strong> Reis em<br />
controvérsia com Álvaro <strong>de</strong> Campos”, “Ricar<strong>do</strong> Reis visto por Fernan<strong>do</strong> Pessoa”,<br />
“Caeiro e Whitman”, “Álvaro <strong>de</strong> Campos, influência <strong>de</strong> Caeiro”, etc. (PESSOA, 1986, p.<br />
725-726).<br />
Que a obra <strong>de</strong> um escritor possa não apenas se prestar a, mas também ser um<br />
exercício comparatista, <strong>de</strong>ve-se à dimensão <strong>de</strong> diversida<strong>de</strong> que ela traz em si. Nesse<br />
senti<strong>do</strong>, dizen<strong>do</strong>-se “o múltiplo que nunca teve uma só personalida<strong>de</strong>” e “saben<strong>do</strong>-se o<br />
ponto <strong>de</strong> reunião <strong>de</strong> uma pequena humanida<strong>de</strong> só sua” (PESSOA, 1986, p. 45-46),<br />
Pessoa apresentou a sua produção literária como os resulta<strong>do</strong>s escritos <strong>de</strong> uma<br />
multiplicida<strong>de</strong>. Desse mo<strong>do</strong>, ele recolocou o <strong>de</strong>bate sobre o Um e o Múltiplo, presente<br />
<strong>de</strong>s<strong>de</strong> os pré-socráticos, no contexto da mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>. 1 A reincidência <strong>de</strong>sse <strong>de</strong>bate<br />
sobre o tema <strong>do</strong> sujeito no mun<strong>do</strong> contemporâneo constituiu uma das razões da<br />
escolha da poética <strong>de</strong> Fernan<strong>do</strong> Pessoa como tema da tese intitulada “Fernan<strong>do</strong> Pessoa<br />
e Jacques Lacan: constelações, letra e livro”.<br />
A constatação inicial é a <strong>de</strong> que, morto como universal, o sujeito renasce “na<br />
multiplicida<strong>de</strong> <strong>de</strong> i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s novas — e não tão novas! — como resulta<strong>do</strong> da<br />
dissolução <strong>do</strong>s lugares <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os quais os sujeitos universais falaram — explosão <strong>de</strong><br />
i<strong>de</strong>ntida<strong>de</strong>s étnicas [...]” (LACLAU, 1996, p. 45-46). Na medida em que, <strong>de</strong>s<strong>de</strong> os<br />
inícios da mo<strong>de</strong>rnida<strong>de</strong>, a poética pessoana sinalizou a existência <strong>de</strong>ssa problemática,<br />
ela não apenas constitui um opera<strong>do</strong>r <strong>de</strong> leitura <strong>do</strong>s novos tempos, bem como se<br />
presta, ela própria, a uma releitura. Nessa retomada, ela beneficia-se “da<br />
efervescência presente atualmente no campo da epistemologia interdisciplinar e da<br />
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