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Contornos do Indizível: o estilo de Clarice Lispector - Fale - UFMG

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Curar as nossas mazelas. (p. 346).<br />

Continua Malvólio:<br />

Isto é que me põe os braços<br />

Caí<strong>do</strong>s, e a boca aberta...<br />

E já daqui vejo os passos<br />

Desta nova <strong>de</strong>scoberta.<br />

Em Tese, Belo Horizonte, v. 10, p. 35-40, <strong>de</strong>z. 2006<br />

Atrás <strong>do</strong>s homens sabi<strong>do</strong>s<br />

Virão os que nada sabem,<br />

E gritarão <strong>de</strong>sabri<strong>do</strong>s<br />

Até que os astros <strong>de</strong>sabem. (p. 347).<br />

A criativida<strong>de</strong> poética <strong>de</strong> Macha<strong>do</strong>, principalmente no tocante à forma, torna-se<br />

tão original que na décima oitava gazeta ao citar Dante Alighieri o poeta reproduz<br />

foneticamente a língua italiana nos <strong>do</strong>is versos finais <strong>de</strong> uma quadra. Eis o trecho:<br />

Ah! Goiás... Goiás existe;<br />

E tanto que, a vinte e <strong>do</strong>is<br />

De março, saiu um triste<br />

E longo ban<strong>do</strong> <strong>de</strong> grous,<br />

Como os <strong>de</strong> que fala o Dante,<br />

Que van cantan<strong>do</strong> lor lai;<br />

Mas cá o pio ora ovante,<br />

Era só: quebrai, quebrai! (p. 350-351).<br />

Algumas gazetas abordam a escravidão e a situação <strong>do</strong>s negros, o que revela um<br />

Macha<strong>do</strong> <strong>de</strong> Assis atento às questões <strong>de</strong> seu tempo. A vigésima terceira, 20 <strong>de</strong> agosto<br />

<strong>de</strong> 1887, conta sobre um certo inspetor que, ten<strong>do</strong> à beira da morte uma escrava,<br />

man<strong>do</strong>u enterrá-la viva:<br />

E que isto <strong>de</strong> meter gente<br />

Viva em caixão <strong>de</strong> fina<strong>do</strong>,<br />

Sem exame competente,<br />

Devia ser castiga<strong>do</strong>; (p. 370).<br />

A vigésima nona gazeta, 27 <strong>de</strong> setembro <strong>de</strong> 1887, ironiza as discussões em torno<br />

da libertação <strong>do</strong>s escravos. De maneira muito perspicaz, chaman<strong>do</strong> um escravo e<br />

perguntan<strong>do</strong> ao próprio sobre sua condição, Macha<strong>do</strong> <strong>de</strong>svenda a retórica a respeito <strong>do</strong><br />

assunto, pois, na prática, o escravo continuava escravo. A resposta <strong>de</strong> “Pai Silvério” é<br />

esclarece<strong>do</strong>ra:<br />

– Meu senhor, eu, entra ano,<br />

Sai ano, trabalho nisto;<br />

Há muito senhor humano,<br />

Mas o meu é nunca visto.<br />

Pancada, quan<strong>do</strong> não ven<strong>do</strong>,<br />

Pancada que dói, que ar<strong>de</strong>;<br />

Se ven<strong>do</strong> o que an<strong>do</strong> ven<strong>de</strong>n<strong>do</strong>,<br />

Pancada, por chegar tar<strong>de</strong>.<br />

Dia santo nem <strong>do</strong>mingo<br />

Não tenho. Comida pouca:<br />

Pires <strong>de</strong> feijão, e um pingo<br />

De café, que molha a boca.<br />

Disponível em http://www.letras.ufmg.br/poslit<br />

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