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As tensões temporais em Mrs Dalloway

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Clarissa percebe sua condição, o modo como vive a sua vida. Enquanto homens e<br />

mulheres morr<strong>em</strong>, ela permanece vivendo sua vida de acordo com os padrões instituídos, na<br />

busca de um sucesso forjado. Força-se a permanecer de pé, dentro do vestuário apropriado<br />

para tal ocasião. Mas houve um dia no qual caminhou sobre o terraço <strong>em</strong> Bourton. Existiram<br />

momentos de felicidade <strong>em</strong> sua vida. Momentos raros e incríveis, vividos no t<strong>em</strong>po certo de<br />

sua duração; n<strong>em</strong> muito longos, n<strong>em</strong> curtos d<strong>em</strong>ais. Enquanto arruma algumas coisas na sala,<br />

pensa na liberdade como instrumento necessário para perder-se no processo da vida, e vivê-la<br />

de acordo com o seu t<strong>em</strong>po peculiar, na plenitude do momento. Clarissa delega esta liberdade<br />

aos triunfos da juventude, que à <strong>Mrs</strong> <strong>Dalloway</strong>, só é possível r<strong>em</strong><strong>em</strong>orar. Clarissa caminha até<br />

a janela e surpreende-se ao ver que sua vizinha está a olhá-la. A velha estava indo para cama.<br />

112<br />

It was fascinating, with people still laughing and shouting in<br />

the drawing-room, to watch that old woman, quiet quietly, going to<br />

bed alone. She pulled the blind now. The clock began striking. The<br />

young man had killed himself; but she did not pity him; with the<br />

clock striking the hour, one, two, three, she did not pity him, with all<br />

this going on [...] She must go back to th<strong>em</strong>. But what an<br />

extraordinary night! She felt somehow very like him – the young man<br />

who had killed himself. She felt glad that he had done it; thrown it<br />

away while they went on living. The clock was striking. The leaden<br />

circles dissolved in the air. But she must go back. She must ass<strong>em</strong>ble.<br />

She must find Sally and Peter. 241<br />

Na festa, possível lugar de encontro não só dos vivos, parece haver a intensificação de<br />

um “fluxo de consciência” 242 . Tudo está no ar e a miscigenação das t<strong>em</strong>poralidades aparece<br />

mais claramente. A batida do relógio parece abranger a imensidão do espaço, instaurando<br />

vínculos que só são possíveis através deste t<strong>em</strong>po convencional. <strong>As</strong>sim, as singularidades dos<br />

afetos de cada um se misturam <strong>em</strong> um só espaço, como se fizess<strong>em</strong> parte de uma só<br />

consciência <strong>em</strong> movimento. Ao encontrar o olhar da vizinha idosa, Clarissa espelha seu<br />

241 Id<strong>em</strong>, p. 135. “Era fascinante olhá-la, aquela velha senhora, movendo-se, atravessando o quarto,<br />

aproximando-se da janela. Poderia ela vê-la? Era fascinante, com toda aquela gente ainda a rir e a falar no<br />

salão, cont<strong>em</strong>plar aquela velha mulher que se preparava tranqüilamente para ir dormir sozinha. Fechou a<br />

cortina. O relógio começou a bater. O jov<strong>em</strong> se havia suicidado; mas não podia lamenta-lo; com o relógio a<br />

bater a hora, uma, duas, três, não podia lamentá-lo, com tudo aquilo indo para diante. [...] Devia ir para junto<br />

deles. Mas que noite extraordinária! Sentia-se de certo modo como ele... o jov<strong>em</strong> que se havia suicidado.<br />

Sentia-se contente de que ele tivesse feito aquilo; alijado a vida, enquanto ela continuava a viver. O relógio<br />

batia. Os pesados círculos se dissolviam no ar. Mas tinha de voltar para junto deles. Tinha de reuni-los. Tinha<br />

de encontrar-se com Sally e Peter”. p. 178-179.<br />

242 O uso do “fluxo de consciência” como método narrativo nos textos de Virginia Woolf pode ter sido influência<br />

de sua amizade com Sigmund Freud e de seu acesso à Psicanálise, como também da influência da literatura de<br />

James Joyce.Conforme BELL, op. cit..

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