As tensões temporais em Mrs Dalloway
As tensões temporais em Mrs Dalloway
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intensificou a força do hábito. A falta de sentido do indivíduo na sociedade, apesar de<br />
representar-se drasticamente <strong>em</strong> Septimus, atinge a todos, d<strong>em</strong>onstrando a nova forma de<br />
experiência na Modernidade, ou o que Benjamin denominou Erlebnis. A dificuldade <strong>em</strong> dar<br />
vazão aos sentimentos, e <strong>em</strong> oferecer um sentido “real” a si, <strong>em</strong> um mundo composto de<br />
atividades fragmentadas, suspende o t<strong>em</strong>po da durée e presentifica o t<strong>em</strong>po das horas, que<br />
aponta para a morte. Esta tensão t<strong>em</strong>poral é muito intensa, no fim da narrativa. A espera de<br />
Peter, carregada de sofrimento, parece querer romper com a força da t<strong>em</strong>poralidade<br />
cronológica; sua suportabilidade está chegando ao fim e a t<strong>em</strong>poralidade afetiva pulsa com o<br />
intuito de dissolver cronos pelo ar. Sally tinha certeza que Clarissa gostava mais de Peter do<br />
que de Richard. Afinal, eram felizes juntos? Sir William Bradshaw e sua esposa passam por<br />
eles. O que alguém poderia saber sobre um casal como aquele?, pergunta Sally. Os Bradshaw<br />
param e olham para um quadro. Sir William Bradshaw tinha tanto interesse pela arte. O<br />
médico valoriza a arte, mas, no entanto, não permite nenhum espaço de “criação” ou<br />
“expressão”, ao tratar com seus pacientes. Há nova crítica aos valores impostos pela<br />
sociedade: todo aristocrata deve, necessariamente, gostar deste tipo de coisa. Sir William,<br />
representante da proporção, não poderia escapar de nenhum dos itens da padronização social.<br />
A festa estava quase no fim. Ainda restava Elizabeth, ao lado do seu pai, mas a maioria dos<br />
convidados já havia ido <strong>em</strong>bora. Os quartos estavam se esvaziando. Sally resolveu se despedir<br />
de Richard, pois estava ficando tarde.<br />
116<br />
‘I will come,’ said Peter, but he sat on for a moment. What is<br />
this terror? What is this ecstasy? He thought to himself. What is this<br />
that fills me with extraordinary excit<strong>em</strong>ent?<br />
It is Clarissa, he said.<br />
For there she was. 248<br />
A presença de Clarissa preenche o t<strong>em</strong>po vazio da espera, das horas que só apontam<br />
para um futuro que nunca chega, a não ser no último fim, no momento da morte. Clarissa está<br />
s<strong>em</strong>pre presente na presença de Peter, r<strong>em</strong>etendo à idéia da duração de Bergson. A<br />
extraordinária excitação que Peter sente sinaliza a força da t<strong>em</strong>poralidade do afeto, tal como o<br />
Big Ben sinaliza a força da t<strong>em</strong>poralidade cronológica. Na certeza do encontro com Clarissa,<br />
pois lá estava ela, o romance finaliza sua narrativa. Na duração cronológica de um dia, a<br />
248 WOOLF, Virginia. <strong>Mrs</strong> <strong>Dalloway</strong>, op. cit., p. 141. “- Eu também vou – disse Peter, mas deixou-se ficar<br />
sentado, um momento. Mas que terror é este? Pensou consigo. Que êxtase me v<strong>em</strong>? Que é que me enche de<br />
tão extraordinária excitação? É Clarissa, descobriu. Pois ela ali estava”. p. 187.