As tensões temporais em Mrs Dalloway
As tensões temporais em Mrs Dalloway
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não encontra lugar para si; parece estar s<strong>em</strong>pre “unable to pass” ou “blocking the way”. Sua<br />
singularidade não flui na constelação da metrópole.<br />
Com o chamado de sua esposa, Lucrezia ou Rezia, Septimus caminha e sai de cena.<br />
Rezia apresenta ao leitor alguns dados referentes à “condição” singular de Septimus e à sua<br />
condição de estrangeira, na sonhada metrópole londrina. Havia abandonado seu país devido<br />
ao casamento com Septimus e, agora, este lhe havia dito que se mataria. Deveriam entrar <strong>em</strong><br />
algum parque, fora o que Dr Holmes havia “ordenado”. Então Rezia agarrou o braço de<br />
Septimus para atravessar<strong>em</strong> a rua. “She had a right to his arm, though it was without feeling.<br />
He would give her, who was so simple, so impulsive, only twenty-four, without friends in<br />
England, who had left Italy for his sake, a piece of bone” 99 . Nesta passag<strong>em</strong>, aparece pela<br />
primeira vez a falta de sensação corporal d<strong>em</strong>onstrada por Septimus. A partir de então, esta<br />
sensação faltante o acompanhará e se intensificará, tornando sua apreensão cada vez mais<br />
tensa. O carro da autoridade, representação da majestade da Inglaterra e da lei, passa por eles<br />
e d<strong>em</strong>onstra, ao contrário de Septimus, a força do seu sentido:<br />
[…] the enduring symbol of the state which will be known to curious<br />
antiquaries, sifting the ruins of time, when London is a grass-grown<br />
path and all of those hurrying along the pav<strong>em</strong>ent this Wednesday<br />
morning are but bones with a few wedding rings mixed up in their<br />
dust and the gold stoppings of innumerable decayed teeth. The face in<br />
the motor car will then be known. 100<br />
A força do poder instaurado pela instituição governante atravessa seu t<strong>em</strong>po. A majestade terá<br />
um lugar ‘eterno’ devido ao seu registro como parte importante e fundadora da história, tal<br />
como Benjamin propôs a distinção entre a história dos “vencedores”, com lugar marcado, e a<br />
história dos “vencidos”, esquecida. Como efeito disso, pressupõe-se uma única história,<br />
regada de valores morais e institucionalizantes como se fosse a única possível, ou a única<br />
existente. A passag<strong>em</strong> do carro também configura a intromissão da história dos “vencedores”<br />
na t<strong>em</strong>poralidade afetiva dos passantes e de Septimus.<br />
99 Id<strong>em</strong>, p. 12. “Tinha direito a seu braço, <strong>em</strong>bora este fosse insensível. E o que o marido lhe podia dar – a ela,<br />
que era tão simples, tão impulsiva, vinte e quatro anos apenas, s<strong>em</strong> amizades na Inglaterra, e que por ele<br />
deixara a Itália – era apenas um osso”. p. 19.<br />
100 Id<strong>em</strong>, p. 13. “[…] o perdurável símbolo do Estado com que os curiosos arqueólogos deparariam, a r<strong>em</strong>exer os<br />
destroços do t<strong>em</strong>po, quando Londres fosse um caminho cheio de ervas e todos aqueles que se afanavam pela<br />
rua naquela manhã de quarta-feira não foss<strong>em</strong> mais que ossos com algumas alianças misturadas a seu pó e as<br />
obturações de ouro de inumeráveis dentes. Seria então descoberta a face do automóvel.” Id<strong>em</strong>.<br />
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