As tensões temporais em Mrs Dalloway
As tensões temporais em Mrs Dalloway
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palavras o levou a não conseguir mais usá-las, resultado da experiência sombria da guerra.<br />
Sua singularidade, marcada pela distinção de seu nome, fora enterrada.<br />
Antes de ir à guerra, Septimus tinha uma vida normal: além de ser funcionário de uma<br />
<strong>em</strong>presa - Sibleys and Arrowsmiths -, era apaixonado pela literatura e por Miss Pole, sua<br />
professora. Mas então, algo aconteceu: a Primeira Guerra Mundial. Septimus foi um dos<br />
primeiros a se voluntariar, por motivos b<strong>em</strong> pessoais e repletos de sentido. “He went to<br />
France to save an England which consisted almost entirely of Shakespeare’s plays and Miss<br />
Isabel Pole in a green dress walking in a square” 116 . Septimus havia ido à guerra por amor à<br />
literatura e à Miss Pole. No decorrer de sua experiência, desenvolveu “hombridade”, foi<br />
promovido e ganhou a atenção e a afeição de seu oficial, Evans. Tornaram-se grandes amigos.<br />
[...] when Evans was killed, just before the Armistice, in Italy,<br />
Septimus, far from showing any <strong>em</strong>otion or recognising that here was<br />
the end of a friendship, congratulated himself upon feeling very little<br />
and very reasonably. The War had thought him. It was sublime. He<br />
had gone through the whole show, friendship, European War, death,<br />
had won promotion, was still under thirty and was bound to survive.<br />
He was right there. The last shells missed him. He watched th<strong>em</strong><br />
explode with indifference. When peace came he was in Milan,<br />
billeted in the house of an inkeeper with a courtyard, flowers in tubs,<br />
little tables in the open, daughters making hats, and to Lucrezia, the<br />
younger daughter, he became engaged one evening when the panic<br />
was on him – that he could not feel. 117<br />
Foi então que Septimus conheceu sua futura esposa, quando estava <strong>em</strong> pânico, por não<br />
conseguir ter sensações. Esta passag<strong>em</strong> retrata sua experiência do trauma, a experiência do<br />
choque como geradora da ausência de sentido. Os ideais modernos são exaltados, a priori,<br />
quando Septimus pressupõe ter adquirido ensinamentos racionais desta experiência e quando<br />
pensa no seu reconhecimento futuro, devido à sua sobrevivência. No entanto, pouco t<strong>em</strong>po<br />
depois, estes mesmos valores sociais entram <strong>em</strong> contraste com seu pânico, d<strong>em</strong>onstrando<br />
novamente o <strong>em</strong>bate entre as t<strong>em</strong>poralidades. O funcionamento da t<strong>em</strong>poralidade<br />
116 Id<strong>em</strong>, p. 64. “Partiu para a França para salvar uma Inglaterra que constituía quase inteiramente das peças de<br />
Shakespeare e de Miss Isabel Pole passeando de verde numa praça”. p. 84.<br />
117 Id<strong>em</strong>. “[...] quando Evans foi morto, pouco antes do armistício, na Itália, Septimus, longe de d<strong>em</strong>onstrar<br />
<strong>em</strong>oção e reconhecer que era o fim de uma amizade, congratulou-se por sentir tão pouco e ser tão razoável. A<br />
guerra o havia educado. Era sublime, aquilo. Passara por tudo, amizade, guerra, morte, fora promovido, ainda<br />
não tinha trinta anos e ia sobreviver. Estava tudo direito. <strong>As</strong> últimas bombas não haviam acertado nele. Vira-as<br />
explodir com indiferença. Quando veio a paz, estava <strong>em</strong> Milão, alojado numa estalag<strong>em</strong>, onde havia um pátio,<br />
flores <strong>em</strong> bacias, e as filhas do proprietário, que faziam chapéus, com a mais moça das quais, Lucrezia,<br />
comprometeu-se uma tarde <strong>em</strong> que o pânico se apoderou dele... porque não podia sentir nada”. p. 84-85.<br />
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