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PAZ, Octavio - Claude Lévi-Strauss ou o Novo - No-IP

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descabida, se pensarmos na energia que ainda irradiam certas palavras);<br />

no que diz respeito às mulheres: foram (e são) signos, elementos desse<br />

sistema de significações que é o sistema de parentesco... Não s<strong>ou</strong><br />

antropólogo e deveria calar-me. Aventuro, em todo caso, um tímido<br />

comentário: a hipótese explica com grande elegância e precisão as regras<br />

de parentesco e de matrimônio pela proibição universal do incesto, mas,<br />

como se explica a própria proibição, sua origem e sua universalidade?<br />

Confesso que me custa aceitar que uma norma tão inflexível e na qual<br />

não é infundado ver a fonte de toda a moral – foi o primeiro Não que o<br />

homem opôs à natureza – seja apenas uma regra de trânsito, um<br />

artifício destinado a facilitar o intercâmbio de mulheres. Além disso,<br />

noto a ausência da descrição do fenômeno; <strong>Lévi</strong>-<strong>Strauss</strong> nos descreve a<br />

operação das regras, não aquilo que regulam: a atração e a repulsão pelo<br />

sexo oposto, a visão do corpo como um entrelaçado de forças benéficas<br />

<strong>ou</strong> nocivas, as rivalidades e as amizades, as considerações econômicas e<br />

as religiosas, o terror e o apetite que desperta uma mulher <strong>ou</strong> um homem<br />

de <strong>ou</strong>tro grupo social <strong>ou</strong> de <strong>ou</strong>tra raça, a família e o amor, o jogo<br />

violento e complicado entre veneração e profanação, medo e desejo,<br />

agressão e transgressão – todo esse território magnético, magia e<br />

erotismo, que cobre a palavra incesto. Que significa este tabu que nada<br />

nem ninguém explica e que, embora pareça não ter justificação biológica<br />

nem razão de ser, é a raiz de toda proibição? Qual é o fundamento deste<br />

Não universal? É verdade que este Não contém um Sim: a proibição não<br />

apenas separa a sexualidade animal da sexualidade social mas, como na<br />

linguagem, este Sim funda o homem, constitui a sociedade. A proibição<br />

do incesto nos faz defrontar, n<strong>ou</strong>tro plano, com o próprio enigma da<br />

linguagem: se a linguagem nos funda, nos dá sentido, qual é o sentido<br />

deste sentido? A linguagem nos dá a possibilidade de dizer, mas que quer<br />

dizer dizer? A pergunta sobre o incesto é semelhante à do sentido da<br />

significação. A resposta de <strong>Lévi</strong>-<strong>Strauss</strong> é singular: estamos diante de<br />

uma operação inconsciente do espírito humano e que, em si mesma,<br />

carece de sentido <strong>ou</strong> fundamento, mas não de utilidade: graças a ela – e<br />

à linguagem, o trabalho e o mito – os homens são homens. A pergunta<br />

sobre o fundamento do tabu do incesto se resolve na pergunta sobre a<br />

significação do homem 'e esta na do espírito. Portanto temos que<br />

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<strong>Octavio</strong> Paz – <strong>Claude</strong> <strong>Lévi</strong>-<strong>Strauss</strong> <strong>ou</strong> o Festim de Esopo 15

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