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PAZ, Octavio - Claude Lévi-Strauss ou o Novo - No-IP

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o Tathagatta viverá depois de sua morte <strong>ou</strong> não, <strong>ou</strong> ambas as coisas, <strong>ou</strong><br />

nenhuma das duas? Para alguns essas perguntas não podiam ser<br />

respondidas; para <strong>ou</strong>tros, Gautama não s<strong>ou</strong>be como responder; e para<br />

<strong>ou</strong>tros, preferiu não responder. K. N. Jayatileke traduz as interpretações<br />

das escolas em termos modernos. 20 Se o Buda não conhecia as respostas,<br />

foi um cético <strong>ou</strong> um agnóstico ingênuo; se preferiu calar porque<br />

respondê-las poderia desviar os <strong>ou</strong>vintes da verdadeira via, foi um<br />

reformador pragmático; se cal<strong>ou</strong> porque não havia resposta possível, foi<br />

um racionalista agnóstico (as perguntas estão mais além dos limites da<br />

razão) <strong>ou</strong> um positivista lógico (as perguntas carecem de sentido e,<br />

portanto, de resposta). O jovem professor singalês se inclina pela última<br />

solução. A despeito de que a tradição histórica pareça contradizê-lo, sua<br />

hipótese me parece plausível se se recorda o caráter extremamente<br />

intelectualista do budismo, fundado em uma teoria combinatória do<br />

mundo e do ego que prefigura a lógica contemporânea. Por esta<br />

interpretação, não muito distanciada da posição de <strong>Lévi</strong>-<strong>Strauss</strong>,<br />

esquece <strong>ou</strong>tra possibilidade: o silêncio, em si mesmo, é uma resposta.<br />

Essa foi a interpretação da tendência Madhyamika e de Nagarjuna e<br />

seus discípulos. Há dois silêncios: um, antes da palavra, é um querer<br />

dizer; <strong>ou</strong>tro, depois da palavra, é um saber que não se pode dizer a única<br />

coisa que valeria a pena dizer-se. O Buda disse tudo que se pode dizer<br />

com as palavras: os erros e os acertos da razão, a verdade e a mentira<br />

dos sentidos, a fulguração e o vazio do instante, a liberdade e a<br />

escravidão do niilismo. Palavra plena de razões que se anulam e de<br />

sensações que se entredevoram. Mas seu silêncio diz algo distinto.<br />

A essência da palavra é a relação e daí que seja a cifra, a<br />

encarnação momentânea de tudo que é relativo. Toda palavra engendra<br />

uma palavra que a contradiz, toda palavra é relação entre uma negação<br />

e uma afirmação. Relação é atar alteridades, não resolução de<br />

contradições. Por isso a linguagem é o reino da dialética que sem cessar<br />

se destrói e renasce só para morrer. A linguagem é dialética, operação,<br />

comunicação. Se o silêncio do Buda fosse a expressão deste relativismo<br />

não seria silêncio mas palavra. Não é assim: com o seu silêncio cessam o<br />

20 Early Budhist Theory of Knowledge, Londres, 1963.<br />

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<strong>Octavio</strong> Paz – <strong>Claude</strong> <strong>Lévi</strong>-<strong>Strauss</strong> <strong>ou</strong> o Festim de Esopo 81

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