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PAZ, Octavio - Claude Lévi-Strauss ou o Novo - No-IP

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modelo das não-verbais. <strong>No</strong> universo propriamente lingüístico a poesia e<br />

a matemática se encontram em situação de oposição simétrica: na<br />

primeira, os significados são múltiplos e os signos inamovíveis; na<br />

segunda, es signos são movíveis e o significado unívoco. É claro que a<br />

música e as <strong>ou</strong>tras artes não-verbais participam desta característica da<br />

poesia. A ambigüidade é o signo distintivo da poesia e esta propriedade<br />

poética converte em artes a música, a pintura e a escultura.<br />

Se das claves se passa às obras, o juízo de <strong>Lévi</strong>-<strong>Strauss</strong> torna-se<br />

ainda mais injusto. A universalidade de uma obra não depende de sua<br />

clave mas de sua mensagem. Explico-me. Aceitarei por um momento essa<br />

infundada pretensão que vê na linguagem musical um sistema de<br />

comunicação mais perfeito que o lingüístico: Debussy é mais perfeito e<br />

universal do que Shakespeare, Goya <strong>ou</strong> os relevos de Baharut que, com<br />

tanta razão, o sábio francês admira? Com uma clave “sensível” El Greto<br />

cria uma obra espiritual e Mondrian uma pintura intelectual que se<br />

limita com a geometria e a teoria binária da cibernética. Com uma clave<br />

que, segundo <strong>Lévi</strong>-<strong>Strauss</strong>, deve p<strong>ou</strong>co aos sons naturais, Stravinski<br />

escreve a Sagração da Primavera, poema das forças e dos ritmos<br />

naturais. A universalidade e o caráter das obras não depende da clave e<br />

sim desse imponderável, verdadeiro mistério, a que chamamos de arte <strong>ou</strong><br />

criação. A confusão entre clave e obra talvez explique os desdenhosos<br />

juízos de <strong>Lévi</strong>-<strong>Strauss</strong> sobre a pintura abstrata, a música serial e a<br />

concreta. Sobre esta última seria preciso dizer que, como a eletrônica, é<br />

parte da busca de uma estrutura sonora inconsciente, <strong>ou</strong> seja, de<br />

unidades concretas naturais. Essa tentativa recorda a “lógica concreta<br />

das qualidades sensíveis” de La pensée sauvage . Aliás, em um dos<br />

livros mais poéticos e estimulantes que li nos últimos anos (Silence) diz<br />

John Cage: “A forma da música nova é diversa da antiga, mas possui<br />

uma relação com as grandes formas do passado, a fuga e a sonata, do<br />

mesmo modo que há uma relação entre estas duas últimas”. Em arte<br />

toda ruptura é transmutação.<br />

Páginas adiante, guiado pelo demônio da analogia, <strong>Lévi</strong>-<strong>Strauss</strong><br />

adverte na música as seis funções que os lingüistas atribuem às<br />

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<strong>Octavio</strong> Paz – <strong>Claude</strong> <strong>Lévi</strong>-<strong>Strauss</strong> <strong>ou</strong> o Festim de Esopo 43

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