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PAZ, Octavio - Claude Lévi-Strauss ou o Novo - No-IP

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em famílias de símbolos. <strong>No</strong>s três o tecido da rede (crivo) é composto de<br />

uma substância impalpável: a morte. <strong>Lévi</strong>-<strong>Strauss</strong> quase não a cita.<br />

Talvez o proíba o seu orgulhoso materialismo. Ademais, de certo ponto<br />

de vista, a morte é apenas <strong>ou</strong>tra manifestação da imortal matéria<br />

vigente. Mas, como não ver nessa necessidade de diferenciar entre<br />

natureza e cultura para em seguida introduzir um termo de mediação<br />

entre ambas, o eco e a obsessão de nos sabermos mortais?<br />

A morte é a verdadeira diferença, a raia divisória entre o homem e<br />

a corrente vital. O sentido último de todas essas metáforas é a morte.<br />

Cozinha, tabu do inces to e linguagem são operações do espírito, mas o<br />

espírito é uma operação da morte. Embora a necessidade de sobreviver<br />

pela alimentação e pela procriação seja comum a todos os seres vivos, os<br />

artifícios com que o homem enfrenta esta fatalidade o convertem em um<br />

ser à parte. Sentir-se e saber-se mortal é ser diferente: a morte nos<br />

condena à cultura. Sem ela não haveria nem artes nem ofícios:<br />

linguagem, cozinha e regras de parentesco são mediações entre a vida<br />

imortal da natureza e a brevidade da existência humana. Aqui <strong>Lévi</strong>-<br />

<strong>Strauss</strong> coincide com Freud e, n<strong>ou</strong>tro extremo, com Hegel e com Marx.<br />

Mais próximo dos dois últimos do que do primeiro, em um segundo<br />

movimento o seu pensamento procura dissolver a dicotomia entre<br />

cultura e natureza – não pelo trabalho, pela história <strong>ou</strong> pela revolução,<br />

mas pelo conhecimento das leis do espírito humano. O mediador entre a<br />

vida breve e a imortalidade natural é o espírito: um aparelho<br />

inconsciente e coletivo, imortal e anônimo como as células. Por isto me<br />

parece ser um homólogo do arco-íris, do veneno para pescar e da<br />

doninha. Como esses três elementos vivazes e fúnebres, por sua origem<br />

está do lado da natureza e por sua função e seus produtos do lado da<br />

cultura. Nele se apaga quase completamente a oposição entre morte e<br />

vida, a significação distinta do homem e a não significação infinita do<br />

cosmo. Diante da morte o espírito é vida e diante desta, morte. Desde o<br />

principio o entendimento humano esbarr<strong>ou</strong> diante da impossibilidade<br />

lógica de explicar o nada pelo ser <strong>ou</strong> o ser pelo nada. Talvez o espírito<br />

seja o mediador. Na esfera da física se chega a conclusões semelhantes; o<br />

Professor John Wheeler, em uma recente reunião da Physical Society,<br />

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<strong>Octavio</strong> Paz – <strong>Claude</strong> <strong>Lévi</strong>-<strong>Strauss</strong> <strong>ou</strong> o Festim de Esopo 33

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