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PAZ, Octavio - Claude Lévi-Strauss ou o Novo - No-IP

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sujeito às expensas do mundo não se limita à corrente idealista: a<br />

natureza histórica de Marx e a natureza “domesticada” da ciência<br />

experimental e da tecnologia também ostentam a marca da<br />

subjetividade. <strong>Lévi</strong>-<strong>Strauss</strong> rompe brutalmente com esta situação e<br />

inverte os termos: agora é a natureza que fala consigo mesma, através<br />

do homem e sem que este se dê conta. Não é o homem mas o mundo que<br />

não- pode sair de si mesmo. Se não fosse forçar demais a linguagem,<br />

diria que o entendimento universal de <strong>Lévi</strong>-<strong>Strauss</strong> é um objeto<br />

transcendental. O “homem em si” nem sequer é inacessível: é uma ilusão,<br />

a cifra momentânea de uma operação. Um signo de troca, como os bens,<br />

as palavras e as mulheres.<br />

Por meio de reduções sucessivas e rigorosas, <strong>Lévi</strong>-<strong>Strauss</strong> percorre<br />

o caminho da filosofia moderna só que em sentido inverso e para chegar<br />

a conclusões simetricamente opostas. Em um primeiro movimento, reduz<br />

a pluralidade das sociedades e histórias a uma dicotomia que as engloba<br />

e as dissolve: pensamento selvagem e pensamento domesticado. Em<br />

seguida, descobre que esta oposição é parte de <strong>ou</strong>tra oposição<br />

fundamental: natureza e cultura. Em um terceiro momento, revela a<br />

identidade entre as duas últimas: os produtos da cultura – mitos,<br />

instituições, linguagem – não são essencialmente distintos dos produtos<br />

naturais nem obedecem a leis diferentes das que regem os seus<br />

homólogos, as células. Tudo é matéria viva, que se transforma. A<br />

própria matéria se evapora: é uma operação, uma relação. A cultura é<br />

uma metáfora do espírito humano e este não é senão uma metáfora das<br />

células e de suas reações químicas que, por sua vez, são <strong>ou</strong>tra metáfora.<br />

Saímos da natureza e a ela retornamos. Só que agora é uma selva de<br />

símbolos: as árvores reais e as feras, os insetos e os pássaros se<br />

transformam em equações. Pode ver-se agora com maior clareza em que<br />

consiste a oposição de <strong>Lévi</strong>-<strong>Strauss</strong> à dicotomia entre história e<br />

estrutura, pensamento selvagem e domesticado. Não é que lhe pareça<br />

falsa mas que, por mais decisiva que seja para nós, não é realmente<br />

essencial. Certo, o acontecer histórico é “poderoso – mas unânime”: seu<br />

reino é a contingência. Cada acontecimento é único e nesse sentido não é<br />

o estruturalismo, mas a história, quem pode, até certo ponto, explicá-lo.<br />

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<strong>Octavio</strong> Paz – <strong>Claude</strong> <strong>Lévi</strong>-<strong>Strauss</strong> <strong>ou</strong> o Festim de Esopo 76

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