PAZ, Octavio - Claude Lévi-Strauss ou o Novo - No-IP
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terceira coluna e a quarta é da mesma índole que a da primeira e da<br />
segunda. Estamos diante de uma dupla parelha de contradições: a<br />
primeira está para a segunda assim como a terceira está para a quarta.<br />
Esta fórmula pode variar: a primeira é homóloga da quarta, a segunda<br />
da terceira. Em termos morais: o parricídio se nega com o incesto; em<br />
termos cosmológicos: negar a autoctonia (ser um homem de fato e de<br />
direito) implica em matar o monstro da terra. O defeito se paga com o<br />
excesso. O mito oferece uma solução ao conflito por meio de um sistema<br />
de símbolos que operam à maneira dos sistemas da lógica e da<br />
matemática.<br />
Ao encontrar a estrutura do mito de Édipo, <strong>Lévi</strong>-<strong>Strauss</strong> se torna<br />
apto para aplicar as mesmas leis combinatórias a mitos de <strong>ou</strong>tras<br />
civilizações. Boas assinalara que as adivinhações são um gênero quase<br />
completamente ausente entre os índios da América do <strong>No</strong>rte. Há duas<br />
exceções: os bufões <strong>ou</strong> palhaços cerimoniais dos pueblo – segundo os<br />
mitos nascidos de um comércio sexual incestuoso – que divertem os<br />
espectadores com adivinhanças; e certos mitos dos índios algonquines,<br />
relativos a corujas que proferem enigmas, os quais, sob pena de morte, o<br />
herói deve resolver.. A analogia com o mito de Édipo é dupla: por um<br />
lado, entre o incesto e adivinhação; por <strong>ou</strong>tro, entre a esfinge e as<br />
corujas. Portanto, há uma relação entre incesto e adivinhação: a<br />
resposta a um enigma une dois termos inconciliáveis e o incesto a duas<br />
pessoas também inconciliáveis. A operação mental em ambos os casos é<br />
idêntica: unir dois termos contraditórios. Esta relação se reproduz em<br />
<strong>ou</strong>tros mitos, só que de maneira inversa. Por exemplo, no mito do Grial.<br />
<strong>No</strong> de Édipo, um monstro postula uma pergunta sem resposta; no mito<br />
celta, há uma resposta sem pergunta. Com efeito, Perceval não se atreve<br />
a perguntar o que é e para que serve o recipiente mágico. Em um caso, o<br />
mito apresenta uma personagem que abusa do comércio sexual ilícito e<br />
que, ao mesmo tempo, possui tal sutileza de espírito que pode resolver a<br />
adivinhação da esfinge; no <strong>ou</strong>tro, há uma personagem casta e tímida que<br />
não <strong>ou</strong>sa formular a pergunta que dissipará o encantamento. Comércio<br />
sexual ilícito = solução de um enigma que planteia a união de dois<br />
termos contraditórios; abstinência sexual = incapacidade para<br />
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<strong>Octavio</strong> Paz – <strong>Claude</strong> <strong>Lévi</strong>-<strong>Strauss</strong> <strong>ou</strong> o Festim de Esopo 21