PAZ, Octavio - Claude Lévi-Strauss ou o Novo - No-IP
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México: o fim das grandes teocracias e o princípio das culturas<br />
históricas (a oposição entre Teotihuacán e Tula, poderia dizer-se, para<br />
simplificar), e a atitude dos astecas diante de Cortés.<br />
Na segunda parte de seu ensaio Léví-<strong>Strauss</strong> recorre a vários mitos<br />
dos índios pueblo para ampliar a sua demonstração. Neles também se<br />
manifesta uma oposição de termos inconciliáveis: autoctonia e<br />
nascimento biológico, mudança e permanência, vida e morte, agricultura<br />
e caça, paz e guerra. Estas oposições nem sempre são evidentes, porque<br />
às vezes os termos originais foram substituídos por <strong>ou</strong>tros. A<br />
permutação de um termo por <strong>ou</strong>tro tem por objeto encontrar termos de<br />
mediação entre as oposições. A forma de operação do pensamento mítico<br />
não é distinta da de nossa lógica; difere no emprego dos símbolos,<br />
porque em lugar de proposições, axiomas e signos abstratos serve-se de<br />
heróis, deuses, animais e <strong>ou</strong>tros elementos do mundo natural e cultural.<br />
É uma lógica concreta e não menos rigorosa que a dos matemáticos. A<br />
posição dos termos de mediação é privilegiada. Por exemplo, a mudança<br />
implica em morte para os índios pueblo; pela intervenção do mediador<br />
agricultura se transforma em crescimento vital. Guerra, sinônimo de<br />
morte, transforma-se em vida por obra de <strong>ou</strong>tra mediação: caça. A<br />
oposição entre animais carnívoros e herbívoros se resolve em <strong>ou</strong>tra<br />
mediação: a dos coiotes e auras que se alimentam de carne como os<br />
primeiros mas que, como os herbívoros, não são caçadores. A mesma<br />
operação de permutação rege a carreira dos deuses e dos heróis. A cada<br />
oposição corresponde um mediador, de modo que a função dos messias<br />
se esclarece: são encarnações de proposições lógicas que resolvem uma<br />
contradição. Algo semelhante ocorre com os gêmeos divinos, os deuses<br />
hermafroditas e uma estranha personagem, o palhaço mítico, que<br />
aparece em muitos mitos e ritos. A penetração psicológica, neste caso,<br />
não é menor que o rigor lógico: o riso, como se sabe, dissolve a<br />
contradição em uma unidade convulsiva que nega os dois termos da<br />
oposição. Entre esses palhaços míticos existe um, o Ash boy, que ocupa<br />
na mitologia dos pueblo um lugar semelhante ao da Cinderela no<br />
Ocidente: os dois são mediadores entre a obscuridade e luz, fealdade e<br />
beleza, riqueza e pobreza, o mundo de baixo e o de cima. A relação entre<br />
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<strong>Octavio</strong> Paz – <strong>Claude</strong> <strong>Lévi</strong>-<strong>Strauss</strong> <strong>ou</strong> o Festim de Esopo 23