Weekend 1197 : Plano 56 : 1 : P.gina 1- - Económico
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22 | Outlook | Sábado, 19.12.2009<br />
BEST OF<br />
Roubar a arte ao lixo<br />
São candeeiros, móveis, objectos que vão além<br />
da decoração. Têm a assinatura de Gezo Marques,<br />
um criativo com atelier no Bairro Alto,<br />
e agora estão à venda na Mood, em Santos.<br />
Decoração? Transformação<br />
Transforma o velho em novo.<br />
Dá-lhe novas funcionalidades<br />
e afirma que quando vende<br />
uma das peças que muitas<br />
vezes ressuscita do lixo sente<br />
dor de pai. As peças têm<br />
nome próprio. Têm uma ficha de identidade.<br />
Têm história. Quando elas vão para<br />
algum lugar é como “se um filho tivesse<br />
ido embora”. Decoração? Talvez seja pouco<br />
para definir o trabalho que Gezo Marques,<br />
director de arte, veio desenvolver<br />
em Portugal depois de ser seleccionado<br />
num concurso, em São Paulo. Veio por um<br />
ano. Pelo menos, esse era o combinado<br />
com a família. “Foi fazer as malas, deixar<br />
tudo e vir para cá”, conta sorrindo. Já lá<br />
vão doze anos e a vontade de partir ainda<br />
não chegou. “Foi paixão à primeira vista.”<br />
E quem é Gezo Marques? Não quer definições<br />
sobre o que faz. Um criativo. Este<br />
brasileiro não se considera um artista. Enquanto<br />
director de arte, trabalha com todos<br />
os meios de comunicação tradicionais.<br />
Mas depois sente a necessidade de expressar<br />
essa criatividade com outros materiais.<br />
“Expresso-me através das telas, camisas,<br />
candeeiros, móveis e objectos.<br />
Adoro produzir coisas. Adoro inventar”.<br />
Foi algo que veio da infância. “Os meus<br />
pais, mais do que inspiração, desafiavam-<br />
-nos. Foi uma infância feliz“. Gezo relembra<br />
as idas ao “ferro-velho” com o pai e as<br />
irmãs, onde procuravam coisas para transformarantes“daondaedamodadareciclagem.<br />
O que podemos tirar e fazer de coisas<br />
que já não têm serventia?” Esta era a<br />
forma como o pai os estimulava. “É uma<br />
forma muito desafiadora de colocar a criatividade<br />
para fora, de olhar as peças e as<br />
coisas com outros olhos. Elas podem transformar-se<br />
em outra coisa”, lembra o artista,<br />
agora com atelier no Bairro Alto, inaugurado<br />
no passado domingo. “Nasceu de<br />
uma necessidade”, diz. É que a expressão<br />
artística de Gezo ocupa espaço e esse ia faltando<br />
em casa. Para lixar, martelar, atear<br />
fogo e arrastar móveis à noite. Gezo explica<br />
ainda que o trabalho em comunicação “é<br />
muito terciarizado. O resultado final envolve<br />
muita gente, muitas mãos, muitas<br />
opiniões”. A oficina funciona como espaço<br />
em que “fecho a porta e desenvolvo exactamenteoquequero,daformaquequero.Ese<br />
tiver que desfazer e fazer de novo, isso é<br />
uma necessidade mais do que um desejo”.<br />
Sobre o facto de ser no Bairro Alto, Gezo<br />
brinca, “se fossemos ver, o bairro não é<br />
nada indicado porque nunca consigo estacionar<br />
na rua. Não consigo descer as latas<br />
de tinta; não consigo parar na porta para<br />
transportar coisas grandes mas é encantador.<br />
E a oficina… Foi o espaço que me encontrou<br />
e não o contrário”. Também sobre<br />
a oficina costuma dizer que é “tipo 112. Costumo<br />
pegar em peças em muito mau esta-<br />
Paulo Alexandre Coelho<br />
A oficina de Gezo Marques<br />
localiza-se no Bairro Alto, na rua<br />
João Pereira da Rosa, nº8<br />
do, e às vezes encontro peças na rua, costumo<br />
dizer que ela passa pelo desfibrilhador.<br />
Dávidadenovo.Éressuscitarcoisasquetão<br />
mortas ou moribundas”. Acha graça e dá-<br />
-lhe muito prazer ver uma peça que estava<br />
completamente abandonada ou no lixo<br />
transformar-se num objecto de desejo,<br />
“que fica na casa das pessoas e que enche o<br />
coração das pessoas quando vêem a peça.<br />
Deixa-me muito satisfeito e faz-me procurar<br />
mais coisas. Serve-me como estímulo”.<br />
Não tem o preconceito de achar redutor o<br />
atributo de decorativo a uma obra de arte.<br />
Quando a peça nasce, nasce com tanta força<br />
que é mais forte do que um rótulo. Nunca<br />
se preocupou com isso. É visceral o produzir,<br />
o pintar, o expressar, o transformar<br />
coisas. O que as pessoas vão considerar decorativo<br />
ou arte, para ele é indiferente<br />
Ontem, a loja Mood inaugurou com uma<br />
exposição sua. O convite surgiu de alguém<br />
que se apaixonou pelo seu trabalho. “Cuidei<br />
mais do que colocar peças. Palpitei muito<br />
no conceito, na decoração. Escolhi e fiz peças<br />
específicas para serem exibidas e vendidas<br />
lá. Foi o primeiro desafio de loja e foi<br />
muito interessante”.<br />
Acredita que o seu trabalho é um conceito<br />
que vem de dentro. Um trabalho<br />
que dá nova vida. Se o publicitário vai descansar<br />
e ficar o artista? “Deus te ouça”,<br />
diz entre gargalhadas.<br />
LUÍSA DE CARVALHO PEREIRA