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Weekend 1197 : Plano 56 : 1 : P.gina 1- - Económico

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42 | Outlook | Sábado, 19.12.2009<br />

VIDA<br />

Os pés pisam um vidro grosso. Dá para a rua<br />

e ilumina o interior. Nele uma frase de Herberto<br />

Helder transformada em objecto de design e que fala<br />

de um absoluto, uma casa, uma leitura pouco óbvia<br />

como Guta gosta que seja a arte: desafiadora<br />

GGuta Moura Guedes, designer.<br />

É assim?<br />

A maior parte das vezes, é.<br />

E quando não é?<br />

(Risos).<br />

Quando preenche um formulário o que<br />

coloca no espaço onde diz ‘profissão’?<br />

Varia.<br />

Em função de quê?<br />

Mesmo nunca tendo estudado design –<br />

estudei dois anos design, sou uma ‘self-<br />

-made de designer’ – colocaria designer,<br />

sem dúvida. É isso que habitualmente<br />

coloco. Mas tenho desempenhado funções<br />

e trabalhos muito distintos que continuo a<br />

encaixar nessa categoria de design porque<br />

faço design estratégico, design de serviços,<br />

design de conceitos.<br />

Há uma frase de Herberto Helder<br />

gravada na casa que está a recuperar.<br />

“A casa - como direi?, – absoluta”.<br />

Aquela casa é um absoluto?<br />

Gosto muito da escrita do Herberto Helder.<br />

Uma das coisas que me fascina nele e nos<br />

temas que escolhe é a ligação forte à<br />

arquitectura. Ando sempre a ler a poesia<br />

dele a tirar frases que vou apontado.<br />

Essas frases são o quê? Inspirações?<br />

São mais identificações do que<br />

inspirações. São frases em que me<br />

identifico. Tenho os livros sempre todos<br />

sublinhados… Mas são sempre<br />

identificações ou choques abruptos, coisas<br />

que não nos pertencem mas que mexem<br />

muito connosco. Neste caso não. “Uma<br />

casa absoluta” porque estou a construir<br />

aquela casa, a minha primeira casa<br />

sozinha. Minha e dos meus filhos. Achei<br />

perfeito, sabendo que uma casa absoluta<br />

nunca existe. O absoluto não existe<br />

também. Fazer uma casa é uma coisa<br />

muito exigente. Não digo que gosto muito<br />

de fazer muitas casas. Gosto imenso de<br />

olhar para as casas e para os espaços<br />

construídos, mas custa-me fazer uma<br />

casa. É muito exigente. Puxa muito por<br />

mim. Estou a gostar. Não sei dizer se é a<br />

minha casa para o resto da vida. Acho que<br />

não é. Nunca é… Há uma espécie de<br />

vertigem.<br />

E tornou a frase do Herberto num<br />

objecto de design.<br />

(Risos) Queria que a frase do Herberto<br />

passasse pelas mãos de um designer de<br />

comunicação e que ele brincasse com as<br />

palavras. Passei ao Nuno Luz, designer da<br />

Experimenta, e ele fez aquela brincadeira<br />

que nem sempre permite uma leitura óbvia<br />

de uma frase que já não é óbvia por si.<br />

Andámos ali de roda de uma série de ideias<br />

dele e chegámos aquela forma que<br />

funciona. Gosto imenso dessa ideia. Gosto<br />

disso em tudo o que faço. A maior parte<br />

das vezes acho que construímos coisas que<br />

são muito passivas, pouco exigentes. As<br />

pessoas devem ser solicitadas a “perder<br />

tempo” com as coisas.<br />

Que lugar ocupam as peças de design<br />

na sua casa?<br />

As minhas casas são muito vazias, têm<br />

pouquissímos objectos. Os objectos<br />

cansam-me. Não gosto de ‘gadgets’, não<br />

gosto de coisinhas. Nada. Nada. Por<br />

natureza não procuro isso. Procuro música,<br />

discos, livros, isso sim são coisas que gosto<br />

de ter. Mas não sou uma coleccionadora,<br />

nunca coleccionaria, não tenho obsessão<br />

de ter peças assinadas; de ter ícones do<br />

design na minha casa. Não tenho. Tenho<br />

coisas simplicíssimas. Não tenho nada<br />

vontade de uma casa cheia de objectos<br />

desenhados por autores conhecidos ou que<br />

sejam referências no mundo do design.<br />

Tenho obsessão por objectos que<br />

funcionem bem. Adoro uma mesa assim<br />

comoesta[agarranamesadocaféàfrente<br />

da qual está sentada], uma cadeira<br />

confortável, uma cama como deve de ser.<br />

Isso sim, gosto muito.<br />

A palavra ‘design’ banalizou-se?<br />

Sim. Deixámos que tivesse um sentido…<br />

Ouve-se dizer “isto é um objecto de<br />

design”, ou “isto é muito design”. É uma<br />

coisa extraordinária. Tudo o que vemos em<br />

nosso redor, seja um porta-chaves um<br />

clip, ou um copo, foi desenhado. Portanto,<br />

tudo é design em certa medida. Pode é ser<br />

bom ou mau. E isso é visto comparando o<br />

objectivo que se quer quando se desenha<br />

uma peça e a performance dessa peça, a<br />

sua eficácia. Quando faço uma casa ou<br />

quando faço um escritório, é claro que o<br />

design está presente. Mesmo que a casa<br />

estivesse toda vazia, mesmo que a casa só<br />

tenha três ou quatro coisas. O desenho do<br />

vazio é também uma opção, é um acto de<br />

design. Depois há peças mais icónicas de<br />

design de autores de que gosto imenso e<br />

que gostava de ter, por exemplo.<br />

Está numa fase de mudança de vida e<br />

não só de mudança de casa…<br />

É engraçado porque às vezes leio isso e não<br />

é bem assim. Há 12 anos que faço<br />

consistentemente uma coisa: a<br />

ExperimentaDesign. Essa é a base. Depois<br />

faço muitas coisas diferentes – não só<br />

“<br />

Em termos<br />

profissionais<br />

as coisas não<br />

acontecem<br />

por acaso. Olho<br />

sempre para<br />

o que fiz<br />

até agora<br />

e a ligação<br />

entre as peças<br />

é perfeita.<br />

São sempre<br />

consequência<br />

do que fiz antes<br />

diferentes, porque são trabalhos distintos,<br />

mas também geograficamente diferentes e<br />

em condições diferentes. Faz parte da<br />

minha natureza. Gosto de fazer muitas<br />

coisas distintas e tenho uma linha de<br />

trabalho que vai unindo aquilo que faço<br />

enquanto plataforma. Essaéafontede<br />

alimento para tudo o resto. Tenho o<br />

cuidado de manter sempre esse tipo de<br />

bases em várias vertentes da minha vida;<br />

na familiar também.<br />

Há pouco, numa conversa informal, dizia<br />

que as pessoas a acham arrogante. Qual<br />

a razão dessa imagem que criou?<br />

Quando sabemos muito bem aquilo que<br />

queremos fazer e por onde queremos ir e<br />

em que direcção, às vezes isso pode ser<br />

visto como uma forma de arrogância. Sou<br />

muito afirmativa na forma de ser, embora<br />

depois seja muito afectiva e ligada às<br />

pessoas. Verdadeiramente afectiva. Mas sei<br />

muito bem o que quero e por onde quero<br />

ir. E às vezes isso é algo intimidante.<br />

E onde quer ir?<br />

Em termos profissionais? As coisas não<br />

acontecem por acaso. Olho sempre para o<br />

que fiz até agora e a ligação entre as peças é<br />

perfeita, são sempre consequência do que<br />

fiz antes, ou onde estive antes e de pessoas<br />

com quem me cruzei e da forma como faço<br />

a gestão desses contactos e desses<br />

entusiasmos. No fundo sou muito selectiva<br />

em relação a esse ‘network’, de pessoas e<br />

de influências. É um ecossistema muito<br />

rico e que vai criando uma série de<br />

oportunidades. E depois, ou se está lá ou<br />

não está, ou se quer ou não aceitá-las. Mas<br />

as coisas não acontecem por acaso. São<br />

sempre fruto de um percurso e de uma<br />

linha de trabalho.Eaformacomome<br />

posiciono funciona como uma espécie de<br />

íman que vai atraindo pessoas, projectos,<br />

convites, desafios. Sou uma provocadora<br />

desses convites.<br />

Foi esse íman que atraiu os<br />

responsáveis pelo novo equipamento<br />

cultural de Paris, o La Gaité, que a<br />

convidaram para comissariar o primeiro<br />

núcleo de programação?<br />

O Jerome Delormas (director-geral do La<br />

Gaité) veio cá em Setembro de 2009 ter um<br />

primeiro encontro comigo. Conhecia o<br />

meu trabalho e queria falar comigo sobre<br />

uma possível ligação entre a Experimenta<br />

e Paris. Tão abstracto quanto isso. Depois,<br />

estivemos em contacto mais duas ou três<br />

vezes e ele esteve a assistir a toda a semana<br />

inaugural da Experimenta Design.<br />

Voltámos a falar sobre o que podíamos<br />

fazer em conjunto com o La Gaité, com a<br />

Experimenta, com Paris, com Lisboa.<br />

Porque à Experimenta e a mim interessa<br />

muito essa ligação com as cidades que<br />

ultrapassa um trabalho às vezes mais<br />

pontual com outros países ou outros<br />

espaços e o Jerome insistia sempre: “tens<br />

que vir a Paris e tens que ver La Gaité”. E<br />

depois convidou-me para ir. Acho que ele<br />

sabia que eu tinha que ver o espaço e

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